Moulin Rouge – Amor em vermelho (2001)

Por André Dick

No início do século, o diretor australiano Baz Luhrmann dirigiu Moulin Rouge – Amor em vermelho de forma superlativa, fazendo com que todos os astros se sentissem no maior filme de suas vidas, cinco anos depois de sua versão contemporânea para a conhecida peça de Shakespeare Romeu e Julieta (na versão de Luhrmann, um + ocupando o “e”, como se assinalasse o fim trágico dos personagens), com atuações estelares de Leonardo DiCaprio e Claire Danes, em início de carreira. Nessa adaptação, o cineasta praticamente adiantava todas as suas principais características, também utilizando o design de produção e a fotografia como componentes decisivos de expressão.
Basicamente, em Moulin Rouge, indicado a vários Oscars, inclusive de melhor filme, e vencedor nas categorias de design de produção e figurino, temos a história de um jovem poeta depressivo, Christian (Ewan McGregor), que chega a Paris, mais exatamente ao distrito de Montmartre, em 1889, para escrever num quarto apertado, tendo como vizinhos do andar de cima uma trupe performática liderada por Henri de Toulouse-Lautrec (John Leguizamo). Luhrmann já adota um visual requintado e fantasioso para empurrar o espectador a algo inusitado.

Na ida ao Moulin Rouge, cujo dono é Harold Zidler (Jim Broadbent), para quem Christian e a trupe pretende vender uma peça, Christian se apaixona pela dançarina Satine (Nicole Kidman), cobiçada por seu um homem que quer investir no lugar, o duque de Monroth (Richard Roxburgh). Eles se conhecem depois de uma apresentação de Satine, e o poeta é confundido com o duque, o que tenta contornar afirmando que ele será o escritor de uma peça dedicada a ela, talvez na sequência que define o filme, uma verdadeira coreografia de Kidman e McGregor para esconder que na verdade se apaixonaram à primeira vista.
A Paris de Luhrmann, fantasiosa (há uma lua que evoca Mèlies, o início é uma cortina se abrindo para o espetáculo), com sua Torre Eiffel de CGI e Kyle Minogue como uma Fada Verde, lembra os experimentos de Jean-Pierre Jeunet em Ladrão de sonhos e é verdadeiramente linda em todos os aspectos, parecendo também uma metalinguagem dos próprios escritos de Christian e de como ele percebe a realidade em torno.

O casal feito por Nicole Kidman e Ewan McGregor, por meio de um roteiro simples, consegue ser mais do que simpático, ao lado de todos os vermelhos em profusão, das canções e coreografias exageradas (transformando até “Smeels like than spirit”, do Nirvana, e “Material girl”, de Madonna, em canções de época). Eles representam todos aqueles enfocados sob uma luz de romantismo exacerbado, com trocas de olhares como efeitos de câmera. É Luhrmann que evoca um tempo no qual poetas morriam de tuberculose, mas é (spoiler) Satine que está doente.
Já se falou o quanto este filme é um “ame-o ou deixe-o”; na verdade, toda a filmografia de Luhrmann parece ser assim. Sua estreia Vem dançar comigo o projetou, e Romeu + Julieta anuncia vários elementos deste, com todas as suas cores mais fortes, as quais o combatido Austrália um tanto atenua, sendo novamente resgatadas em O grande Gatsby. Trata-se de um novo caminho para o musical e a reação quase sempre desproporcional dos personagens parece evocar uma experimentação de animações (ecoando também Dick Tracy), incluindo o exagero e câmera acelerada. Não há nenhuma cadência no filme, ou seja, o ritmo é intenso, sem brechas para respirar, o que parece proposital, e na maior parte do tempo funciona.

As cores, o design de produção e os figurinos são notavelmente belos, evocando grandes musicais da era dourada de Hollywood, como Nasce uma estrela e Cantando na chuva, dos anos 50, assim como de suas reprises em New York, New Yok, dos anos 70, mesclando um pouco com musicais de Bollywood e ambientações que ecoam As mil e uma noites. Cada enquadramento, quando o filme não recorda um videoclipe, parece um extrato de pintura de época. O elenco acentua para que essa impressão se estabeleça, não apenas McGregor, num de seus melhores momentos, mas, sobretudo, Kidman, um ano antes do seu Oscar por As horas e mostrando bom equilíbrio entre o humor e o drama, e Broadbent. O vilão é caricato porque a história em marcha é sobre um amor proibido, que vai se estabelecendo na peça sendo escrita. Moulin Rouge, com seu exagero habitual, acaba sendo o retrato de uma época fantástica de cultura, contracultura e underground mesclado ao mainstream da Paris. Embora não haja nada de verdadeiramente novo, ele é um experimento visual que impõe respeito pela tentativa de grandiosidade e homenageia sua época de maneira poética. Visto hoje, é ainda um exemplo de como trazer fôlego para um gênero tão explorado por décadas.

Moulin Rouge!, EUA/AUS, 2001 Diretor: Baz Luhrmann Elenco: Nicole Kidman, Ewan McGregor, John Leguizamo, Jim Broadbent, Richard Roxburgh Roteiro: Baz Luhrmann, Craig Pearce Fotografia: Donald M. McAlpine Trilha Sonora: Craig Armstrong Produção: Martin Brown, Baz Luhrmann, Fred Baron Duração: 128 min. Estúdio: Bazmark Productions Distribuidora: 20th Century Fox

 

Gangues de Nova York (2002)

Por André Dick

O diretor Martin Scorsese havia saído de um experimento chamado Vivendo no limite, com Nicolas Cage como o motorista de uma ambulância, em diálogo com Taxi Driver, seu clássico dos anos 70, um pouco antes de ingressar num dos seus projetos mais ambiciosos, Gangues de Nova York. Nunca foi o desejo de Scorsese recontar a história dos Estados Unidos, preferindo mostrar o universo de gângsteres em obras como Os bons companheiros, Cassino e O irlandês, a desestrutura psicológica baseada no traço cômico em O rei da comédia e Depois de horas, assim como certo medo que se reflete em indivíduos, em peças como Cabo do medo. Desse modo, Gangues se torna um filme essencial para compreender outros meandros de sua filmografia, e uma influência direta para Lincoln, por exemplo, de Spielberg.
No início, acontece uma batalha no Five Points, Manhattan , em 1846, entre duas gangues: uma de William Cutting, ou Bill, o Açougueiro (Daniel Day-Lewis), e um grupo de imigrantes católicos irlandeses, os “Dead Rabbits”, liderados pelo “Padre” Vallon (Liam Neeson). Os homens estão armados de maneira bárbara, suscitando uma época sem nenhuma lei envolvida, apenas o instinto e a tentativa de impor a própria condição e origem. Não é spoiler, mas necessário dizer que Bill mata Vallon, declarando os adversários fora da lei.

O filho de Vallon é levado para um orfanato e ressurge depois de 16 anos usando o pseudônimo de Amsterdam (Leonardo DiCaprio). Primeiramente ele reencontra um antigo amigo, Johnny Sirocco (Henry Thomas, de E.T.), que passa a contar sobre a rotina dos núcleos que constituem a então cidade de Nova Tork, até levá-lo a Bill, aquele que o filho do Padre Vallon deseja matar para concretizar a vingança.
Amsterdam conhece nesse meio tempo a ladra Jenny Everdeane (Cameron Diaz), por quem Johnny é apaixonado. Amsterdam acaba aos poucos se tornando um dos melhores amigos de Bill. Em torno circula o político William M. Tweed (Jim Broadbent)., à frente do Tammany Hall, e Amsterdam também reencontra Walter “Monk” McGinn (Brendan Gleeson) e Walter “Monk” McGinn (John C. Reilly), que eram próximos do seu pai.
Scorsese constrói essa saga de maneira muito ágil, editando as cenas de forma abrupta com a colaboração vital de Thelma Schoonmaker. Desde o início, ele oferece um escopo em escala épica, procurando rapidamente a motivação dos personagens para que, ao longo da trama, sejam desenvolvidos. Não apenas Day-Lewis tem uma atuação excepcional como Bill, mas DiCaprio também consegue captar um personagem que age perturbado por uma consequência do passado.

O duelo entre os dois, tanto em atitudes quanto em atuações, abrange talvez o que Gangues de Nova York mais tem a oferecer, junto com seu contexto sobre os primórdios da cidade em que se passa a história. Tirando o porto no qual chegam os imigrantes principalmente da Irlanda, já encaminhados para lutar pela Confederação, Scorsese evita mostrar muitos cenários, concentrando-se mais nas ruas e interiores onde Bill fica com sua gangue. Diaz tem um papel de interesse romântico para Jenny Everdeane – e, numa época em que era uma das atrizes com maior salário de Hollywood, tem seu papel talvez mais exitoso da carreira, com o lapso de Scorsese em praticamente colocá-la em segundo plano no terceiro ato.
Até determinado ponto, sua presença é de muito destaque, sobretudo porque tem uma relação como amante com Bill e mais romântica com Amsterdam; sua figura faz a costura entre as diferenças desses dois e é entregue de maneira empenhada por Diaz, com sua mescla entre certa destreza e ingenuidade. Podia haver certa influência, pelo contexto de época, com a personagem de Winona Ryder em A época da inocência em outra abordagem, porém se mostra mais complexa do que aquela no próprio resultado alcançado por Scorsese, cuja narração em Gangues de Nova York é mais contida, dando mais expansão aos próprios personagens e suas reações.

Gangues de Nova York costuma ser comparado com O portal do paraíso, de Michael Cimino, e sem dúvida há cenários, detalhes de interiores, que os aproximam  fala-se que Scorsese o teria filmado antes não fosse o fracasso de bilheteria daquele. No entanto, a abordagem de Scorsese é mais comercial e direta, embora não menos interessante na essência, conduzindo os eixos de modo particularmente feliz. De maneira abrupta, o início lança tudo para um duelo que vai ser incorporado ao longo da trama e distribuído na tensão entre os demais personagens. Alguns ressurgem do passado para atormentar Amsterdam, outros seguem em sua penumbra. Há valores de amizade aqui, mas a Scorsese interessa mais uma concepção religiosa em atrito com a condução politica, que se dá de maneira ampla e irrestrita com a ajuda da trilha sonora impactante de Howard Shore e os efeitos sonoros. O roteiro de Jay Cocks, complementado por Kenneth Lonnergan – cineasta que faria bons trabalhos em tramas expansivas como Margaret e Manchester à beira-mar – e Steven Zaillian – responsável por trabalhos com grande número de personagens e ações, como O gângster e Êxodo, de Ridley Scott – exerce uma grande influência para o resultado, apostando na interconexão entre vários núcleos narrativos que vão se aproximando e se completando.
A figura de Bill traz à memória exatamente, no figurino, a de Lincoln e ele se cerca de homens como se fosse uma figura pública capaz de, ao contrário do presidente dos Estados Unidos fez, manter as pessoas divididas em gangues para uma tensão constante, e não parece por acaso que ele também fica atirando facas em imagens que encontra do político. Num passeio inicial que faz pelas ruas, com os fogos de artifício ao fundo, Bill evoca Max Cady de Cabo do medo. Scorsese, em termos de estilo, não explora tanto seus travellings, preferindo acompanhar seus personagens em quadros que evocam mais pinturas, também por causa da excelência do design de produção e dos figurinos. Sob determinado ponto de vista, é interessante como esse filme também revitaliza uma certa visão sobre a influência da religiosidade, que se manifestou antes principalmente em Kundun e se reproduziria anos mais tarde em Silêncio, também com a participação de Liam Neeson. Quando Bill chega a um determinado extremo, e Amsterdam precisa se refugiar na antiga igreja do pai, é um dos momentos mais sagazes do cinema deste século: é o diálogo entre o movimento histórico e a mudança captada por meio de certa violência misturada com uma tentativa apenas de sobreviver ao próprio tempo.

Gangs of New York, EUA, 2002 Diretor: Martin Scorsese Elenco: Leonardo DiCaprio, Daniel Day-Lewis, Cameron Diaz, Jim Broadbent, John C. Reilly, Henry Thomas, Brendan Gleeson Roteiro: Jay Cocks, Steven Zaillian, Kenneth Lonergan Fotografia: Michael Ballhaus Trilha Sonora: Howard Shore Duração: 167 min. Estúdio: Touchstone Pictures, Miramax Films,Alberto Grimaldi Productions, Initial Entertainment Group Distribuidora: Buena Vista Distribution

Peixe grande e suas histórias maravilhosas (2003)

Por André Dick

Como todo cineasta, Tim Burton sempre dedica um projeto em meio a outros a suas obsessões maiores. Depois de realizar Batman em seguida aos seus autorais As aventuras de Pee Wee Herman e Os fantasmas se divertem,.embora também com sua marca especial na adaptação do super-herói da DC para as telas, ele regressaria com intensidade com Edward mãos de tesoura. E, logo depois de Batman – O retorno, ele faria Ed Wood, a cinebiografia que é um de seus melhores momentos.
Quando Burton surgiu com Peixe grande e suas histórias maravilhosas, ele havia feito anteriormente sua criticada (e boa) adaptação e Planeta dos macacos. Era o momento, portanto, para se voltar a um script mais particular. É o que faz aqui, ao filmar a vida de um senhor, Ed Bloom (Albert Finney), que está doente e conta histórias fantásticas ao filho Will (Bill Crudup). O desejo deste é se reconciliar com o pai, com a presença da mãe Sandra (Jessica Lange) e ao lado da esposa Josephine (Marion Cotillard), na volta à sua casa em Ashton, no Alabama.

Na juventude, Ed é vivido por Ewan McGregor, que faz amizade primeiro com um gigante que atormenta a sua cidezinha, Karl (Matthew McGrory) – e, quando corta a barba e cabelo, é convidado a ir embora, o que Bloom acompanha – e depois chega a uma cidade secreta, Spectre, onde faz amizade com um poeta saído de Ashton, Norther Winslow (Steve Buscemi), e a filha do prefeito, Jenny (Hailey Anne Nelson). Na continuação da jornada, ele se depara com um grupo de circo, liderado por Amos Callaway (Danny DeVito), e com uma bruxa (Helena Bonham-Carter). No circo, ela conhece Sandra Templeton (Alison Lohman), por quem se apaixona. O filho deseja descobrir se as histórias são reais e sai em busca disso – inclusive com a famosa história de ter pego um peixe grande.
Burton oscila novamente entre a realidade e a fantasia, como em A lenda do cavaleiro sem cabeça e Edward, mãos de tesoura. O diretor tem uma especial consideração por este personagem do pai contador de histórias, como se estivesse retratando sua própria carreira, em meio a devaneios de fábulas, antes de sua fase mais amarga, aquela de Alice no país das maravilhas.

O filme guarda seu registro como cineasta interessado pelas lendas do interior norte-americano, a partir do livro de Daniel Wallace, o que pode se corresponder, inclusive, com Forrest Gump, mesclado com seu excepcional A lenda do cavaleiro sem cabeça. Na maneira como retrata os cenários, no entanto, ele retoma elementos de Os fantasmas se divertem e Edward na simetria das casas, e na coleção de histórias retoma As aventuras de Pee Wee, dos anos 80, com certa ingenuidade. McGregor, fazendo o Ed mais jovem consegue desenhar um personagem modesto e, ao mesmo tempo, gentil. Suas lembranças de como teria conhecido sua amada mulher estão entre os mais belos da trajetória de Burton, com uma espécie de intensificação de um romantismo que dá espaço a certa melancolia. Mais exatamente quando conhece o dono do circo, que, para lhe revelar detalhes de sua amada, que frequenta o local, o faz de empregado, registra uma espécie de sonho americano que Burton retomaria em Dumbo, com certo olhar triste, assim como quem é de fato o dono do circo.
Do mesmo modo, quando Burton mostra quem de fato é a bruxa das histórias de Ed, há uma espécie de retomada de uma característica do cineasta – da mulher que é solitária, personificada por Sandra, com atuação atenciosa de Jessica Lange, e de Jenny, vivida por Bonham Carter.

Na fotografia de Phillipe Rousselot Buiton colhe um certo ar europeu, mesmo com suas paisagens dialogando com a cultura norte-americana, e a brincadeira com a literatura, por meio do poeta que está na escondido de cidade de Spectre, a fim de escrever seu épico – que Bloom constata não ser mais que um poema óbvio com três linhas. Burton se dedica aqui, mais do que nunca, a ser uma espécie de Spielberg dos anos 80 em formato mais agridoce, sabendo lidar com certos sentimentos de decepção que às vezes não são tão bem trabalhados pelo mestre da fantasia dos anos 90. Além disso, não só por meio das figura, ele apresenta um design de produção notável, sobretudo quando Bloom participa da Segunda Guerra Mundial ou quando tem seu carro submerso numa grande enchente quando está voltando para sua cidadezinha. É uma espécie de contínuo retorno que Burton proporciona a seu filho, uma ilha de desejo por nais criatividade e pela maneira inigualável de querer transformar história simples em algo mais extraordinário e chamativo para as pessoas. O terceiro ato do seu filme acaba, nesse sentido, explorando mais seu olhar dos anos 90, de Edward e Ed Wood, com uma notável perspicácia em filmar o diferente de maneira acessível e comovente.

Big fish, EUA, 2003 Diretor: Tim Burton Elenco: Ewan McGregor, Albert Finney, Billy Crudup, Jessica Lange, Helena Bonham Carter, Alison Lohman, Robert Guillaume, Marion Cotillard, Steve Buscemi, Danny DeVito Roteiro: John August Fotografia: Philippe Rousselot Trilha Sonora: Danny Elfman Produção: Richard D. Zanuck, Bruce Cohen, Dan Jinks Duração: 125 min. Estúdio: Columbia Pictures, Jinks/Cohen Company, The Zanuck Company Distribuidora: Sony Pictures Releasing

Superman II – Corte de Richard Donner (2006)

Por André Dick

Neste momento em que Zack Snyder vai conseguir finalmente trazer à cena sua versão original para Liga da Justiça, que teve, depois de um afastamento conturbado seu, uma finalização de Joss Whedon, o diretor de Os vingadores, é interessante lembrar do caso de Superman II. Ele foi feito por Richard Donner ao mesmo tempo que o primeiro, lançado em 1978, mas sua versão de fato não foi lançada nos cinemas em 1980. Em razão de os produtores Alexander e Ilya Salkind não pretenderem pagar um acréscimo financeiro para Marlon Brando, que fazia o pai de Superman, Jor-El, que já tinha feito cenas para o segundo, Donner não aceitou sua exclusão, foi afastado e substituído por Richard Lester, que, para poder assinar o filme, teve de realizar ou refazer ao menos 51% das cenas dele. A versão de Donner foi lançada apenas em 2006 em Blu-ray e DVD, incluindo as cenas com Brando e, apesar de conter quase todas as cenas da versão do cinema, não têm algumas acrescentadas por Lester e possui outras que mudam o significado.
Donner é uma diretor especialista em filmes de ação com drama e comédia, o que pode ser constatado em filmes como Os GooniesMáquina mortífera. Em Superman, ele estabelece um padrão para o que viria na década seguinte, com o Batman, de Tim Burton, e com certo bom humor recente e vertiginoso de Os vingadores, de Joss Whedon. O Superman de Reeve, e isso se deve sobretudo à visão de Donner, é, sobretudo, alguém indefinido entre tempos diferentes: ao mesmo tempo em que conserva um ar dos anos 40, 50, ele consegue efetuar uma transição para os momentos em que precisa enfrentar seu maior inimigo, Luthor,de maneira plausível.

Na versão de Donner para Superman II, é estabelecida uma conexão diretamente com o final do primeiro. Se na versão de Lester Zod (Terence Stamp), Non (Jack O’Halloran) e Ursa (Sarah Douglas ), expulsos de Krypton no início do original, eram libertados de sua prisão numa espécie de espelho gigante pela explosão de uma bomba tirada pelo Superman da Torre Eiffel, na versão de Donner eles já se libertam com a explosão do míssel teleguiado por Lex Luthor levado ao espaço sideral pelo super-herói antes de fazer o tempo voltar. A versão de Donner reprisa também mais claramente a expulsão de Zod, Non e Ursa por Kal-El (Marlon Brando), enquanto na versão de Lester era mais rápida e quase incompreensível.
Por sua vez, as cenas iniciais no Daily Planet são muito mais interessantes na versão de Donner, não apenas pela fotografia de Geoffrey Unsworth, como pela tentativa de Lois (Margot Kidder) descobrir se Clark Kent (Christopher Reeve) é Superman, primeiro pintando uma foto do super-herói com os óculos e terno do parceiro de trabalho e depois jogando-se do prédio – o que inexiste na versão exibida nos cinemas. Clark está cada vez mais próximo de Lois e ambos, inclusive, vão viajar juntos para as cataratas do Niágara. Na versão de Lester, este trecho se prolonga; com uma cena buscando comicidade na figura de um funcionário do hotel onde se hospedam, na de Donner é mais sintética. No filme assinado por Lester, é quando Lois tenta provar que Clark é Superman, atirando-se nas águas do Niágara. Ele está cansado de ser herói, deseja ser humano, e, para isso, volta às suas origens, à Fortaleza da Solidão, em que está a explicação do seu passado, para tentar ser igual aos demais seres humanos.

Lá estiveram antes Luthor e sua assessora Eve Teschmacher (Valerie Perrine) – na versão de Lester conversando com a mãe, Lara (Sussanah York), de Superman; na de Donner, com seu pai. No entanto, chegam os três criminosos à Terra depois de uma passagem pela Lua (que aparece nas duas versões): coronel  Zod, Non e Ursa, mandados embora de Krypton no início do primeiro filme, condenados por Jor-El, e eles vão querer perturbar a população, sobretudo o filho de quem os mandou embora, tendo como aliado Lex Luthor. Luthor tenta chegar às origens do herói, a fim de tentar encobri-lo com sua tentativa de romper o mundo. Mas sua relação com Superman é estranha: ao mesmo tempo que proporciona doses de violência, sobretudo moral, ele não consegue se posicionar como um vilão todo o tempo, e tenta disfarçar com uma ironia seca seu objetivo (e Hackman não quis refazer nenhuma de suas cenas com Lester; aquelas em que aparece foram todas filmadas por Donner).
A questão é como o herói voltará a ser como era antes. Como observa Pauline Kael, “as transições de Clark Kent para Super-Homem e vice-versa agora são números cômicos bem acabados”. Nesse sentido, se a versão de Lester é mais cômica, a de Donner é mais séria, com a presença de Marlon Brando e sequências mais impressionantes (como a inicial). Donner dosa a humanidade de Clark sem torná-la superficial ou maniqueísta (na interpretação talentosa de Reeve). É interessante como os vilões também conseguem ficar no limite do bom humor aceitável, principalmente em sequências com duelos militares e na famosa invasão da Casa Branca -os primeiros numa cidade do interior feitas exclusivamente por Lester.

Há muitas cenas de ação de destaque, efeitos especiais melhores do que o primeiro, e no todo trata-se de uma continuação divertida, apoiado novamente num roteiro de Mario Puzo (criador de O poderoso chefão), com a colaboração de David e Leslie Newman. E a versão de Donner conta com a fotografia de Geoffrey Unsworth, que fez a do primeiro e faleceu em 1979; as cenas modificadas ou acrescentadas por Lester têm a fotografia de Robert Paynte, não tão talentoso. Não existe também, na versão de Lester, a melancolia impregnada por Donner nas bordas de suas versões: o seu Superman é, ao mesmo tempo, um herói e alguém realmente trágico, não com rompantes para o humor exagerado. A maneira como Clark recupera seus poderes com a ajuda do pai é definitiva. Jor-El parece abandoná-lo quando surge do além e lhe transmite os poderes de volta. Não que Lester não perceba a essência dele, mas é certo que Donner consegue desenhá-la de maneira mais adequada, assim como sua relação conflituosa com o pai que não conheceu e com a dualidade entre alguém de outro planeta e o humano. Se eu fosse indicar uma versão do filme, seria a de Donner lançada em 2006.

Superman II – The Richard Donner Cut, ING/EUA, 2006 Diretor: Richard Donner Elenco: Christopher Reeve, Gene Hackman, Marlon Brando, Ned Beatty, Jackie Cooper, Sarah Douglas, Margot Kidder, Valerie Perrine, Susannah York, Terence Stamp, Jack O’Halloran Roteiro: Mario Puzo, David e Leslie Newman Fotografia: Geoffrey Unsworth e Robert Paynte Trilha Sonora: John Williams  Produção: Pierre Spengler e Michael Thau Duração: 117 min. Distribuidora: Warner Bros.

300 (2006)

Por André Dick

Na virada do século, o filme Gladiador, de Ridley Scott, retomou a ideia de um cinema épico baseado na ideia de homens lutando em arena. O personagem principal, Maximus, cujo intérprete, Russell Crowe (ganhador do Oscar de ator), faz crer numa volta a um tempo clássico, de Spartacus, é um fiel seguidor de Marcus Aurelius (Richard Harris), imperador de Roma, mas é traído e se torna um gladiador. Roma passa a ser governada por um tirano, Commodus (Joaquin Phoenix), o filho de Marcus Aurelius. Ridley Scott consegue transformar o argumento em imagens antológicas de lutas em arenas, com atuação eficiente de todo o elenco (cada personagem é tratado de forma nada unidimensional). A direção de arte e os efeitos especiais também são de muita consistência, sobretudo porque estamos diante de um filme de época, que leva o espectador por algumas horas numa volta a um tempo histórico, com uma trilha sonora magnífica de Hans Zimmer e Lisa Gerrard, além da fotografia irretocável de John Mathieson.

Em Madrugada dos mortos, a refilmagem do clássico dos anos 70 dirigido por George Romero, que marca a estreia na direção de Zack Snyder, baseado num roteiro de James Gunn, que viria a dirigir Guardiões da galáxia, o diretor não mostra completamente seu estilo, no entanto consegue extrair situações interessantes de um panorama caótico. Seu real estilo viria a partir de 300, que ingressou exatamente nesse universo suscitado por Scott, remetendo também a Os 300 de Esparta.
A mitologia greco-romana sempre atraiu o olhar de cineastas com interesse pelo trabalho narrativo e pela questão visual: tivemos nos anos 80 Fúria de titãs, precursor de muitos elementos do campo de efeitos visuais, assim como sua refilmagem nos anos 2010, e Tróia, o grandioso experimento de Wolfgang Petersen.
Snyder adaptou 300 com fidelidade à HQ de Frank Miller, e o elenco oferece um desempenho dedicado. O filme inicia mostrando a infância do rei Leônidas: aos 7 anos, é afastado de sua mãe para iniciar o agogê, período de privações a que os cidadãos de Esparta são levados.

Depois de 30 anos, um mensageiro persa (Peter Mersah) chega a Esparta falando que Xerxes I (Rodrigo Santoro) quer dominar a território – assim como outros povoados gregos à época. Leônidas (Gerard Butler), casado com a Rainha Gorgo (Lena Headey), decide aniquilar toda a comitiva. Sendo período da festa de Carneia, ele seleciona 300 homens de sua guarda para enfrentar os invasores da Pérsia – levando-se em conta que em Esparta os homens eram treinados para lutar em batalhas. A seu lado, estão Stellios (Michael Fassbender), Dilios (David Wenham), Capitão Artemis (Vincent Regan) e seu filho Astinos (Tom Wisdom). Mas contra está o político Theron (Dominic West). Tudo tem como centro a Batalha das Termópilas de 480 a.C.
Com poucos diálogos (sendo uma obra essencialmente de batalhas) e trama não trabalhada de forma suficiente, na qual o rei Leônidas enfrenta, com seus homens, o exército persa de Xerxes. 300 se sente, mais do que outros filmes de Snyder acusados disso, mais estilo do que substância. A violência prepondera do início até o fim, principalmente na segunda metade em larga escala, e Snyder usa e reusa a câmera lenta para criar cenas de impacto – e ainda assim muitas sem o peso emocional necessário. Há uma tentativa de traçar duelos políticos e uma certa privação da mulher num universo predominantemente masculino, e Snyder faz isso ligando os personagens a uma certa tentação pelo que pode levá-los à queda. O rei Xerxes – com uma voz acentuadamente estranha de Rodrigo Santoro – é o símbolo de uma espécie de avanço do pecado contra uma comunidade que, longe de ser ingênua, ainda tenta conservar seus integrantes.

Como no seu filme de estreia, Snyder tem noção de cenas de ação e da potência dos embates, além do cuidado uso de efeitos sonoros capazes de amplificar a atmosfera, mas ainda lhe falta uma certa reflexão que viria com Watchmen, em sua lentidão. Ainda assim, é um estilo único, e pode-se dizer que os quadrinhos de Miller são traduzidos em perícia visual de um modo que dificilmente seria visto novamente, nem mesmo em sua sequência, quase uma década mais tarde, com Eva Green como a grande vilã. Isso se deve também ao trabalho de fotografia de Larry Fong, que voltaria a trabalhar com Snyder em Batman vs Superman, utilizando os recursos do CGI para iluminar cada cena de maneira grandiosa e tentando buscar comparações diretas da pintura. É aí que a obra de Snyder cresce em retrospectiva, aliando atuações boas num cenário de batalha devastador que não faz o espectador esquecer daquilo pelo qual esses homens estão lutando, colocando em questão diálogos sobre honra, traição, fidelidade e amor cercado pela morte.

300, EUA, 2006 Diretor: Zack Snyder Elenco: Gerard Butler, Lena Headey, David Wenham, Dominic West Roteiro: Zack Snyde, Kurt Johnstad, Michael B. Gordon Fotografia: Larry Fong Trilha Sonora: Tyler Bates Produção: Gianni Nunnari, Mark Canton, Bernie Goldman Jeffrey Silver Duração: 116 in. Estúdio: Legendary Pictures, Virtual Studios, Atmosphere Pictures, Hollywood Gang Productions
Distribuidora: Warner Bros. Pictures

Encontros e desencontros (2003)

Por André Dick

No seu segundo filme, Encontros e desencontros, Sofia Coppola tenta fazer uma comédia agridoce depois de seu vital As virgens suicidas – que consegue contrabalançar as estranhezas com magníficas atuações de Kirsten Dunst e James Woods – e consegue, tornando-se uma referência, que manteria com Maria Antonieta e Um lugar qualquer (que se parece com este em sua estrutura de tédio). Enquanto o casal do filme combina, mesmo bastante diferente (Bill Murray e Scarlett Johansson), o roteiro, também escrito por Sofia, em grande parte, encadeia uma sucessão de momentos soltos da vida de ambos. O filme parece entrar na onda de seu título original (“Perdido na tradução”) e tenta dar a impressão apenas do deslocamento de um ator de Hollywood, Bob Harris (Bill Murray), que está no Japão para rodar um comercial de uísque por 2 milhões de dólares, e Charlotte (Scarlott Johansson), que faz pós-graduação em Filosofia pela Yale e é abandonada no hotel por seu marido, John (Giovanni Ribisi), fotógrafo de moda.

A realização tenta ser contemporânea: nunca vemos os personagens em situações forçadas e a trilha (com elementos indie e dos anos 80) remete a um sentimento de existência solitária numa cidade grande. Esta grande qualidade do filme acaba sendo também seu lado menos atrativo: o espectador não é atraído por nenhum conflito; pelo contrário, a experiência de assisti-lo parece ser a mesma dos personagens que perambulam por ele, em busca de uma razão para entender o outro e o diferente. Murray tem grande tendência para atuações patéticas, e neste filme ele tenta sublimá-las com seu melhor momento, sobretudo num momento em que tenta correr na esteira. As cenas em que filma a propaganda sem entender japonês é divertida e constrangedora por causa dele (embora saibamos que um astro como ele andaria com um tradutor, ou seja, há buracos substanciais no roteiro, que, no entanto, conseguem fornecer um certo aspecto indeterminado).

Bob conhece Charlotte no bar do hotel e logo fazem amizade. Quando voltam a se encontrar nas noites seguintes, ela o convida para participar de uma festa com outros jovens. Em clima de melancolia e de crise da meia idade, Bob Harris cria um interesse platônico por Charlotte. Isso se costura mais por meio de imagens do que palavras, e certamente é esta saída que deu a Sofia o Oscar de melhor roteiro original.
No seu livro referencial sobre o Japão, O império dos signos, e entendo que Sofia o leu antes de escrever o roteiro, Roland Barthes escreve – e poderia servir para o casal formado por Bob e Charlotte e suas peregrinações: “A cidade de que falo (Tóquio) apresenta este paradoxo precioso: possui certamente um centro, mas esse centro é vazio. A cidade toda gira em torno de um lugar ao mesmo tempo proibido e indiferente, morada escondida pela vegetação, protegida por fossos de água, habitada por um imperador que nunca se vê, isto é, literalmente, por não se sabe quem. Diariamente, em sua circulação rápida, enérgica, expeditiva como a linha de um tiro, os táxis evitam esse círculo, cuja crista baixa, forma visível da invisibilidade, oculta o ‘nada’ sagrado. Uma das duas cidades mais poderosas da modernidade é, portanto, construída em torno de um anel opaco de muralhas, de águas, de tetos e de árvores, cujo centro nada mais é do que uma ideia evaporada, subsistindo ali não para irradiar algum poder, mas para dar a todo o movimento urbano o apoio de sue vazio central, obrigando a circulação a um perpétuo desvio. Dessa maneira, dizem-nos, o imaginário se abre circularmente, por voltas e rodeios, ao longo de um sujeito vazio” (Tradução de Leyla Perrone-Moisés, p. 46)

É em meio a esse “anel opaco de muralhas, de águas, de tetos e de árvores” que transcorre o filme de Sofia. A distância que Bob sente da jovem pelo qual é atraído, de qualquer modo, é a mesma que ele tem por esse país distante: a vontade de tocá-la é a mesma de esquecer que está distante, mas que quer voltar, pela liberdade que ele concede. O casal vai a um karaokê, anda por Tóquio animado (num momento indie), a uma boate, com seus neons, volta ao quarto de hotel, apanhando um elevador e dorme abraçado, introspectivamente. O que importa a eles é a companhia, nada mais, por isso tanta densidade nessa aproximação. Mesmo a amiga de Bob, a atriz de Hollywood Kelly (Anna Faris), não a traz para um interesse do cenário.
São belas, também as cenas em que Charlotte, solitária – e sua personagem é o alter ego de Sofia –, caminha pelo parque Hyatt. Como escreve Barthes: “Da encosta das montanhas ao canto do bairro, tudo aqui é habitat, e estou sempre no cômodo mais luxuoso desse habitat: esse luxo (que é alhures o dos quiosques, dos corredores, das casas de prazer, dos gabinetes de pintura, das bibliotecas privadas) vem do fato de esse lugar não ter outro limite senão seu tapete de sensações vivas, de signos resplandecentes (flores, janelas, folhagens, quadros, livros); não é mais o grande muro contínuo que define o espaço, é a própria abstração dos pedaços vistos (de ‘vistas’) que me cercam: o muro está destruído sob a inscrição, o jardim é uma tapeçaria mineral de pequenos volumes (pedras, rastros do ancinho sobre a areia), o local público é uma série de acontecimentos instantâneos, que chegam ao notável num brilho tão vivo, tão tênue, que o signo se abole antes de qualquer significado ter tido o tempo de ‘pegar’”.

O filme trata da imersão desses personagens num cenário estranho, do qual não fazem parte, porém que, aos poucos, começa a impregná-los. Os letreiros em movimento da cidade e as longas ruas e passarelas lembram uma efusão constante de pessoas, muitas sem uma direção definida. Sofia consegue desenhar, com isso, um elemento de reflexão sobre aquilo que parece não permanecer em meio a uma paisagem grandiosa, que é exatamente o da reflexão sobre os pequenos gestos – e adormecer no ombro alheio passa a carregar toda uma mudança de percepção cultural.
Na verdade, Encontros e desencontros é um produto acabado dos anos 2000, com sua espécie de síntese entre o sentimento de vazio do indivíduo e sua tentativa de compreendera paisagem que o cerca – e a cidade de Tóquio se presta com perfeição a isso. Não há dúvida de que Sofia, com sua sensibilidade particular, anuncia aqui o que expandiria ainda mais em Maria Antonieta.

Lost in translation, EUA, 2003 Diretor: Sofia Coppola Elenco: Bill Murray, Scarlett Johansson, Giovanni Ribisi, Anna Faris, Fumihiro Hayashi Roteiro: Sofia Coppola Fotografia: Lance Acord Produção: Sofia Coppola, Ross Katz Duração: 105 min. Estúdio: American Zoetrope e Elemental Films Distribuidora: Focus Features (Estados Unidos), Tohokushinsha Film (Japão)

Star Wars: A ameaça fantasma (1999), Ataque dos clones (2002) e A vingança dos Sith (2005)

Por André Dick

Seria difícil que George Lucas, após 22 anos afastado das câmeras, como diretor, conseguisse criar uma obra equivalente à primeira trilogia, no primeiro episódio da segunda franquia de Guerra nas estrelas, intitulado A ameaça fantasma. Não querendo oferecer seu novo projeto a outros diretores, como fez com O império contra-ataca e O retorno de Jedi, ele tentou evitar aquilo que os fãs mais fiéis temiam: que o estilo e magia da saga se perdessem pelos corredores de sua empresa ILM. O mais interessante nesse filme é, dessa maneira, a maneira como Lucas não chega a congelar os personagens, que, mesmo não substituindo o carisma dos originais, conseguem, num primeiro momento, agradar.
Iniciando por uma retrospectiva da série, o que mais chama a atenção em A ameaça fantasma é que Lucas apresenta personagens interessantes, mesmo não substituindo o carisma dos originais. Na pele do mestre Jedi Qui-Gon Jinn, Liam Neeson consegue mostrar novamente que é um bom ator, substituindo o estilo sábio de Alec Guiness do primeiro Guerra nas estrelas. Parece ser de Ewan McGregor, na pele de Obi-Wan Kenobi, a atuação menos convincente (se alguém esquecer outro personagem do filme), levemente deslocado, sendo, no período, um ator de produções independentes, como Cova rasa e Trainspotting.

A história do primeiro episódio da nova trilogia é simples como todas as outras da saga, embora aqui com peso maior político. A fim de realizar um acordo com a Federação Comercial, sobre rotas do comércio intergaláctico, a rainha Padmé Amidala (Natalie Portman), do planeta Naboo, envia os dois cavaleiros Jedi, Qui-Gon Jinn e Obi-Wan Kenobi. Eles, no entanto, caem numa armadilha e descobrem que há uma invasão planejada ao planeta Naboo. Acabam voltando a ele em naves invasoras e, ao se depararem com Jar Jar Binks, conhecem os Gungans, que vivem submersos num lago (a melhor criação de Lucas para o filme, embora com elementos de O segredo do abismo, de Cameron), com o objetivo de pedir ajuda para salvar Amidala (não nos percamos nos nomes). A rainha, mesmo sem a ajuda dos Gungans, acaba sendo salva, mas a nave de fuga de Naboo acaba tendo problemas – sendo salva por um droide, chamado R2-D2 (Kenny Baker) – e é obrigada a pousar no planeta desértico de Tatooine, palco de sequências em Guerra nas estrelas e O retorno de Jedi. Ali, Qui-Gon Jinn acaba descobrindo Anakin Skywalker (Jake Lloyd), criador do robô C-3PO (Anthony Daniels) e escravo do estranho alienígena voador Watto, que, para conseguir as peças que consertem a nave da rainha, precisa entrar numa corrida de miniespaçonaves (pods) no deserto, patrocinada por Jabba (o monstrengo da reedição de Guerra nas estrelas e de O retorno de Jedi). Anakin combaterá Darth Anakin vive com a mãe Shmi (Pernilla August).

É visível como Lucas, neste reingresso em seu universo, optou por um direcionamento infantojuvenil, tanto  no desenho dos personagens quanto na sucessão de batalhas que parecem mais parte de um video game. Porém, ainda assim, ele consegue desenvolver certa mitologia dos Jedi, por meio do encontro de Qui-Gon Jinn e Obi-Wan Kenobi com Anakin. Resulta, por vezes, em certo material expositivo, e ainda assim se contrapõe às discussões sobre política no espaço sideral. Algumas cenas são verdadeiramente bem feitas, como a corrida de Anakin no deserto, proporcionando um visual notável, outras insistem demasiadamente num humor que se mostra deslocado. Lucas tenta mesclar o material mais sério da primeira trilogia, por meio de frases de sabedoria, e insere uma origem enigmática para o jovem Anakin, porém sem aliviar o peso de mostrá-lo como um escravo, em busca de libertação, o que concede uma complexidade ao que acontecerá depois a ele.

A ameaça fantasma não anuncia o estilo do segundo, Ataque dos clones, cujo tom interno é de mais melancolia e romance, contrariando o primeiro desta trilogia, mesmo com a habitual trilha sonora animada de John Williams. Os atores estão um tanto engessados pelo roteiro, e Hayden Christensen é uma escolha não tão acertada para Anakin Skywalker: ainda assim, quem faria melhor com os diálogos entregues, de uma simplicidade visível e que Harrison Ford certamente não seguiria? Bem, até Christensen não está tão mal numa revisão. O romance de Anakin com Padmé Amidala (Natalie Portman), que se transformou em senadora da República, acontece repentinamente; por outro lado, ele não desaquece a parte mais interessante, que é a perseguição de Obi-Wan Kenobi (Ewan McGregor) a quem ameaça Amidala, chegando a Jango Fett (Temuera Morrison), pai do pequeno Boba (Daniel Logan) – um dos vilões da primeira trilogia. Yoda e Mace Windu (Samuel L. Jackson) estão preocupados com a revolta crescente de Anakin e entregam a ele a tarefa de vigiar Amidala. Anakin tem pesadelos com a mãe que não vê há dez anos, precisando regressar a Tatooine, num momento que remete à primeira trilogia. E há Christopher Lee como o Conde Dooku, trazendo intrigas aos jedi. A questão política envolvendo a princesa, por quem Anakin se apaixona, continua presente, e Palpatine (Ian McDiarmid) tenta organizar o jogo.

O filme inicia com uma perseguição fantástica em cenários que remetem a Blade Runner e segue em planetas oceânicos (Kamino, que possui uma estação com interiores evocando THX 1138, obra que projetou Lucas) ou desérticos, com fugas fantásticas em meio a meteoros. O desenho de produção deste episódio, vendo anos depois e com uma imagem melhor do que a do digital no cinema, destacando a fotografia de David Tattersall (e justificando por que as irmãs Wachowski o chamaram depois para fazer o trabalho em Speed Racer), é muito bom, escolhendo cores acertadas para cada ambiente – e isso é metade da fantasia. E a trama, se não tem grandes diálogos, nunca interrompe o fluxo: Lucas não é um grande diretor de atores, e ainda assim ele sabe dar uma cadência de aventura a suas histórias, baseando-se numa sensível melhora na atuação de McGregor em relação ao primeiro. Os últimos 40 minutos passados em Geonosis, uma espécie de Tatooine, reservam alguns momentos memoráveis, tanto em termos de efeitos especiais quanto de design, além das lutas. Lucas havia sido pego na metade do cainho pela onda O senhor dos anéis e tenta inserir um pouco desse universo em cenários de cavernas com inúmeras criaturas, antecipando igualmente John Carter, muito presentes no trabalho de Peter Jackson. A fascinação de Lucas pelo CGI e pelo digital também transforma alguns momentos muito próximos de uma animação, trazendo, por um lado, um trabalho interessante de cores e, por outro, uma certa artificialidade. E o filme, sem dúvida, cresce como uma antecipação de A vingança dos Sith, em razão de uma escalada rumo a um desfecho mais grandioso e que cria certo impacto e interessante para o melhor episódio da segunda trilogia.

As cenas de ação ininterruptas e o excesso de acontecimentos de A vingança dos Sith não chegam a cansar, e Lucas entrega uma obra verdadeiramente à altura da saga original, embora sempre sem o mesmo humor e sem os mesmos personagens expressivos (apesar de Yoda e da reaparição, por momentos, de Chewbacca). O cineasta, na verdade, não quis abrir a concessão de que a tecnologia da nova trilogia não substitui um elenco interessante e interessado. Embora Lucas ainda continue um diretor com dificuldades para lidar com atores, Christensen, McGregor e Portman, desperdiçada em diálogos sem muito vigor nos filmes anteriores, passam por acontecimentos que merecem destaque e conseguem diminuir a distância emocional que havia entre eles. Na pele da rainha Padmé Amidala, especialmente Portman, alguns anos depois da atuação em O profissional, sem sinais do futuro Cisne negro, não desaponta, apresentando uma atuação conflitante. Parece ser de Ewan McGregor, como Obi-Wan Kenobi, a atuação mais dedicada, fazendo um bom contraponto a Christensen, que consegue fugir um pouco ao estilo consagrado em Jumper – mas o final surpreende quando finalmente ele adquire uma ressonância que faltou um pouco à trilogia.
A vitalidade também resulta dos efeitos especiais, porém pertence muito mais a uma montagem que não deixa de amarrar a história da traição de Palpatine (McDiarmid) e a transformação consequente em mestre de Anakin (e Andersen, que parecia apático no segundo, transmite uma expressão pessoal de desespero), a um passo de se tornar Darth Vader. E o jedi Mace Windu (Jackson) finalmente tem uma participação decisiva na história.

A revolta de Anakin tem um lado bastante obscuro, aqui, pela primeira vez, aliada a um grande sentimento de perda, em relação a seu próprio futuro; mais do que uma fantasia, o comportamento dele decisivamente é perturbador. Anakin, portanto, quando viaja para outro planeta, a fim de deflagrar o domínio da galáxia, leva todos os personagens ao que seria a antiga trilogia, com figuras estranhas, robôs mais inovadores do que os dois primeiros episódios da nova trilogia e cenas de batalha realmente notáveis, sobretudo no início do filme e na investida contra os jedis da República. Existe, no personagem, um conflito com a imagem da infância, e é esta torna o olhar de Lucas mais compenetrado e negativo. Ao contrário da primeira trilogia, Ataque dos clones já tinha uma melancolia, mas este, sem negá-la, consegue inseri-la numa narração, tornando alguns dos momentos interessantes e de significado para a ligação com a primeira trilogia, e a sensação é uma mescla de perda e nostalgia. Há um trabalho elaborado de fotografia tanto no que diz respeitado ao jogo de luzes (a chegada de Anakin à Terra e o reencontro com Padmé Amidala ganha um tratamento específico de Lucas) quanto ao uso de cores (a primeira batalha antecipa boa parte dos efeitos usados hoje em produções recentes) e de movimentação de câmeras que remetem ao talento inicial de Lucas para uma visão futurista, entregue em THX 1138, seu filme ainda mais experimental.
A vingança dos Sith ganha elementos próprios mesmo em relação aos outros da série, com uma certa ambiguidade na ação dos personagens, tornando-o talvez o mais denso. Com desenho de produção impressionante, figurino rebuscado, lutas com certo impacto – quase ausentes no segundo, por exemplo –, o episódio faz esquecer, em parte, o desapontamento visível na comparação com a primeira trilogia. Uma das poucas ficções clássicas deste início de século. Lucas realmente demonstra interesse em finalizar a trilogia e nos guarda uma peça a ser revista, forte o suficiente para não ter o impacto reduzido dez anos depois.

Star Wars: episode I – The phantom menace, EUA, 1999 Diretor: George Lucas Elenco: Liam Neeson, Ewan McGregor, Natalie Portman, Jake Lloyd, Ian McDiarmid, Anthony Daniels, Kenny Baker, Pernilla August, Frank Oz Roteiro: George Lucas Fotografia: David Tattersall Trilha Sonora: John Williams Produção: Rick McCallum Duração: 138 min. Estúdio: Lucasfilm Ltd. Distribuidora: 20th Century Fox


Star Wars: episode II – Attack of the clones, EUA, 2002 Diretor: George Lucas Elenco: Ewan McGregor, Natalie Portman, Hayden Christensen, Ian McDiarmid, Samuel L. Jackson, Christopher Lee, Anthony Daniels, Kenny Baker, Frank Oz Roteiro: George Lucas e Jonathan Hales Fotografia: David Tattersall Trilha Sonora: John Williams Produção: Rick McCallum Duração: 142 min. Estúdio: Lucasfilm Ltd. Distribuidora: 20th Century Fox

 

Star Wars: episode III – Revenge of the Sith, EUA, 2005 Diretor: George Lucas Elenco: Ewan McGregor, Natalie Portman, Hayden Christensen, Ian McDiarmid, Samuel L. Jackson, Jimmy Smits, Frank Oz, Anthony Daniels, Christopher Lee, Keisha Castle-Hughes, Silas Carson, Jay Laga’aia, Bruce Spence, Wayne Pygram, Temuera Morrison, David Bowers, Oliver Ford Davies  Roteiro: George Lucas Fotografia: David Tattersall Trilha Sonora: John Williams Produção: Rick McCallum Duração: 140 min. Estúdio: Lucasfilm Ltd Distribuidora: Fox Film

Série Indiana Jones (1981, 1984, 1989, 2008)

Por André Dick

Os caçadores da arca perdida, como se sabe, é a aventura que consagrou Indiana Jones como o herói da década de 1980, um arqueólogo que dá aulas de História, graças, em grande parte, à atuação de Harrison Ford. Na primeira jornada, já começa em plena ação, sendo perseguido por uma tribo indígena depois de apanhar uma relíquia numa caverna cheia de pistas falsas no Peru e traído pelo companheiro de viagem (um jovem Alfred Molina) – essa introdução é memorável. Logo em seguida, procurado pelo governo dos Estados Unidos na universidade onde dá aula e é amigo do dono de museu Marcus Brody (Denholm Elliott), ele vai em busca da Arca da Aliança, no Poço das Almas, no Egito, onde Moisés teria deixado a Tábua dos Dez Mandamentos. Enfrentando uma trupe de nazistas, que tem como arqueólogo o francês René Belloq (Paul Freeman). e Major Toht. (Ronald Lacey) como líder imediato, ele reencontra uma antiga namorada, Marion Ravenwood (Karen Allen), num bar do Nepal, com mau destino depois de uma sequência de lutas divertidas e violentas.
A passagem dele pelo Cairo, Egito, em busca do objeto divino, é a melhor parte do filme, mostrando como Spielberg está em busca não apenas da aventura, mas do mistério de relíquias históricas e inserindo o ótimo personagem Sallah (John Rhys-Davies).

As idas e vindas do roteiro (não sabemos se a mocinha escapou de uma explosão, por exemplo) são exploradas ao limite, entretanto sem menosprezar a inteligência do espectador. Mais do que um professor e aventureiro, Indiana Jones encarna a tentativa de encontrar a história na rotina. Ele possui medo mortal de cobra, sobretudo. Seu visual (um arqueólogo de chapéu e chicote) remete aos filmes de infância, ainda que não sabemos bem a quais. E alguém que precisa se deparar não só com o roubo histórico, como também com o próprio nazismo e a obsessão de Hitler em tomar contato com o que, em sua visão, é capaz de deixá-lo com mais poder ainda. Os caçadores… recebeu cinco Oscars (montagem, direção de arte, som, efeitos sonoros, efeitos especiais), tendo sido ainda indicado nas categorias de melhor filme, direção e roteiro (de Lawrence Kasdan, baseando-se em história de George Lucas e Phillip Kaufman, diretor de A insustentável leveza de ser), fotografia e trilha sonora (mais um trabalho marcante de John Williams, na sua melhor fase). E Spielberg já insere aqui a presença dos nazistas, o que trataria de modo histórico em A lista de Schindler. São eles que desejam a Arca da Aliança, com o objetivo de possuírem ter um acesso ao desconhecido. No entanto, deparam-se com Indiana Jones e com o fato de a Arca não poder ser aberta, pois, antes de mais nada, seria um veículo de “comunicação com Deus”, o que não seria propenso aos alemães seguidores de Hitler.

Indiana Jones e o templo da perdição segue Os caçadores da arca perdida, e, como o terceiro ato do filme de 1981, procura a ação incessante. Com roteiro de Gloria Katz e Williard Huyck (autores de Loucuras de verão com George Lucas), mostra o arqueólogo inicialmente em uma de suas jornadas por Shangai, China (em 1935, um ano antes do filme original), acompanhado por um ajudante mirim, Short Round (o ótimo Ke Huy Quan, de Os Goonies) e da cantora brega Willie Scott (Kate Capshaw). Sim, são dois estereótipos, mas nem por isso menos divertidos. Depois de um acidente de avião no Himalaia, eles caem perto da vila Mayapore, no norte da Índia, que teve suas plantações queimadas e as crianças levadas por uma entidade chamada Shiva, depois de uma pedra sagrada ter sido roubada.
Já se percebe que, mesmo com a ação fantasiosa de Os caçadores da arca perdida, Spielberg exerce seu poder sobre imagens que atraem pela inverossimilhança – é nisso o personagem sobrevive, cercado de personagens que parecem saídos de um musical dos anos 30 (não à toa, o filme começa exatamente com um número musical). Todo o modo com que Spielberg relata a primeira parte faz parte de outro imaginário, de produções B, ao contrário da classe atingida em Os caçadores da arca perdida.
Indiana chega com os amigos ao Palácio Pankot, onde, além de encontrar uma seita de fanáticos (com rituais macabros, como arrancar o coração de uma pessoa viva e afundá-la no fogo) liderada involuntariamente pelo marajá Zalim Singh (Raj Singh), descobre as crianças do vilarejo trabalhando feito escravas para procurar outras pedras sagradas, enterradas em catacumbas, onde existe uma mina. Já sabemos de início que ele não tem a seriedade de parte de Os caçadores da arca perdida, com suas referências religiosas, mas mesmo assim é um passeio curioso. Extremamente bem feito, a parte técnica tem achados (figurino e design de produção) e a direção de Spielberg em cenas como a do banquete ou do momento no qual Willie espera uma declaração amorosa de Indiana é particularmente inspirada. Às vezes, Spielberg se excede na violência, em oposição a um tratamento quase juvenil de determinadas situações e, em outras ele prefere a fantasia de modo preponderante, para aliviar alguma saída que soa um pouco realista demais para seu objetivo. De modo geral, ele conecta os personagens por meio da ação e o seu humor tenta equilibrar a narrativa.

Repleto de ação e talvez mais bem-humorado do que os dois primeiros, com a mesma trilha musical de John Williams, e roteiro elaborado por Jeffrey Boam (Máquina mortífera II). Indiana Jones e a última cruzada inicia mostrando a juventude de Indiana Jones (em atuação de River Phoenix) em 1912, fugindo de ladrões com uma relíquia em Utah. Revela-se, de forma convincente, como surgiram o chapéu, o chicote e o medo de cobras do herói. Num salto no tempo, já adulto, luta contra os mesmos bandidos, atrás da mesma relíquia. A ação não para nunca, e talvez Spielberg esteja disfarçando um pouco que o filme é uma reedição de Os caçadores da arca perdida sob um ponto de vista da paternidade. Indiana entra no plano de reencontrar seu pai, desaparecido enquanto procurava o cálice do Santo Graal.
Seu pai, Henry Jones (Connery), foi capturado pelos nazistas e Indiana é contratado pelo milionário Walter Donovan (JUlian Glover) para encontrá-lo. Nesse meio tempo, ele tem um caso com Elsa Schneider (Alisson Doody), foge de ratos, há uma perseguição eletrizante de lanchas em Veneza, outra em motos, e se encaminha para a caverna onde está o Cálice do Graal. Bastante parecido com o primeiro também no que se refere ao aspecto religioso e o interesse nazista por peças religiosas, este Indiana é, com todo seu aspecto de filme de aventuras descompromissado, antológico. É impressionante como Spielberg consegue efetuar transições por meio de uma edição ágil e nunca torna a violência impactante em excesso, preferindo vê-la mais como numa espécie de animação. A ligação entre pai e filho também funciona não apenas por Ford e Connery, mas porque Boam consegue inserir elementos de melancolia e lembrança juvenil e de como uma relação passada não tão resolvida pode se manifestar melhor numa situação de alto risco, assim como o regresso dos personagens de Marcus Brody e Sallah adicionam elementos cômicos imprevistos e a fotografia de Douglas Slocombe, responsável pela dos dois filmes anteriores também, é exímia em captar dias ensolarados ou nublados, criando uma atmosfera imersiva. Também talvez seja interessante apontar como Quentin Tarantino se inspirou, aqui e ali, para compor seu roteiro de Bastardos inglórios.

Em Indiana Jones e o reino da caveira de cristal, Harrison Ford decidiu regressar ao personagem de Indiana Jones depois de George Lucas e Steven Spielberg retomarem uma série que já era dada como finalizada. Neste episódio, os elementos lembram, principalmente, do início de Os caçadores da arca perdida, no qual Indiana está no mesmo depósito do desfecho no primeiro filme, desta vez em 1957. Ele é capturado por agentes soviéticos liderado por uma agente russa, da KGB, Irina Spalko (Cate Blanchett), que deseja chegar a uma misteriosa caveira de cristal, capaz de dar acesso a um universo paralelo – e nesse caso já sabemos que, em se tratando de Spielberg, deve ser algo parecido com Contatos imediatos do terceiro grau. Toda essa parte termina com uma explosão bastante exagerada, mostrando que, se os outros tinham sequências inverossímeis, este se aprimora em fazê-las ainda mais inverossímeis.
Quando consegue fugir do grupo de soviéticos, Indy volta à universidade para lecionar história, mas é procurado por um jovem, Mutt Williams (Shia LaBeouf), que tem uma carta de Harold Oxley (John Hurt), passada por sua mãe, Marion (Karen Allen), da obra original. Este é o motivo para Indiana vir à América do Sul, investigar onde se encontram as pistas dadas por Oxley. O país é o Peru, fechando um círculo em relação ao primeiro filme, onde vai à noite a um cemitério, sendo atacado por várias crianças assustadoras, até chegar à caveira de cristal. Em seguida, ele é novamente capturado pelo grupo chefiado por Irina. Reencontra Marion e a ação incessante começa, para não parar mais, em meio a perseguições na Amazônia (obviamente impossíveis de acontecer).

O humor fica a cargo do quarteto Ford-LaBeouf-Allen-Hurt, explorando, de modo inteligente, um roteiro um tanto limitado de David Koepp (Jurassic Park) para o tempo que durou o hiato entre Indiana Jones e a última cruzada e este, de quase 20 anos, inserindo pelo menos um personagem dispensável: George “Mac” McHale (Ray Winstone). No entanto, é um referencial no que diz respeito a lances sobre os anos 50, desde os mistérios escondidos numa sede secreta dos militares até uma cidade com manequins para experimentos com a bomba atômica (e até esquecemos os momentos com as marmotas saindo de buracos na terra que aproximam Spielberg de uma tentativa de reproduzir a Disney). Trata-se de uma sátira, em alguns momentos, à Guerra Fria, no entanto sem se entregar a um revisionismo histórico previsível. As dicas estão lá e são muito bem inseridas em meio à história, com uma coerência por vezes não encontrada no mais elogiado Indiana Jones e o templo da perdição. .O interessante aqui também é a parte técnica: a fotografia de Janusz Kamiński evocando os anos 70 é excelente, e a trilha sonora de John Williams mais uma vez marca boa presença. O mais engraçado é, sem dúvida, Ford, sempre oferecendo uma boa interpretação, desta vez em estilo mais ranzinza, que viria a adotar a partir de então. Entre efeitos visuais baseados em CGI ou locações de estúdio em alguns instantes, evocando as aventuras dos anos 50, Indiana Jones e o reino da caveira de cristal parece ser, por enquanto, o penúltimo dessa série antológica, pois ainda se anuncia um quinto para 2022.

Raiders of the lost ark, Diretor: Steven Spielberg Elenco: Harrison Ford, Karen Allen, Paul Freeman, Ronald Lacey, John Rhys-Davies, Denholm Elliott Roteiro: Lawrence Kasdan Fotografia: Douglas Slocombe Trilha Sonora: John Williams Produção: Frank Marshall Duração: 115 min. Estúdio: Lucasfilm Ltd. Distribuidora: Paramount Pictures

 

Indiana Jones and the temple of doom, EUA, 1984 Diretor: Steven Spielberg Elenco: Harrison Ford, Kate Capshaw, Amrish Puri, Roshan Seth, Philip Stone, Ke Huy Quan Roteiro: Willard Huyck e Gloria Katz Fotografia: Douglas Slocombe Trilha Sonora: John Williams Produção: Robert Watts Duração: 118 min. Estúdio: Lucasfilm Ltd. Distribuidora: Paramount Pictures

 

Indiana Jones and the last crusade, EUA, 1989 Diretor: Steven Spielberg Elenco: Harrison Ford, Denholm Elliott, Alison Doody, John Rhys-Davies, Julian Glover,Sean Connery Roteiro: Jeffrey Boam Fotografia: Douglas Slocombe Trilha Sonora: John Williams Produção: Robert Watts Duração: 126 min. Estúdio: Lucasfilm Ltd. Distribuidora: Paramount Pictures

 

Indiana Jones and the Kingdom of the Crystal Skull, EUA, 2008 Diretor: Steven Spielberg Elenco: Harrison Ford, Cate Blanchett, Karen Allen, Ray Winstone, John Hurt, Jim Broadbent, Shia LaBeouf Roteiro: David Koepp Fotografia: Janusz Kamiński Trilha Sonora: John Williams Produção: Frank Marshall Duração: 122 min. Estúdio: Lucasfilm Ltd. Distribuidora: Paramount Pictures

 

Cruzada (2005)

Por André Dick

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Poucos são os cineastas que conseguem voltar a um tempo demarcado da história sem darem a impressão de que estão querendo apenas relatar fatos. Ridley Scott é um deles. Ele sempre fez filmes primorosos visualmente (como Os duelistas, Alien e Blade Runner). A partir do novo século, ele passou a focar mais em dramas cotidianos, mas sempre com cenários elaborados, alternando com peças de sentido histórico. Vencedor do Oscar em 2001, Gladiador é um feito moderno da narrativa mais simples e, ao mesmo tempo, épica, grandiosa. O personagem principal, interpretado por Russel Crowe, é traído e precisa recuperar sua dignidade voltando à Roma para salvá-la de um tirano (Joaquin Phoenix), o filho do antigo César. O argumento é mais do que previsível, contudo Ridley Scott consegue transformá-lo em imagens antológicas de lutas em arenas, com atuação eficiente de todo o elenco. A direção de arte e os efeitos especiais também são de muita consistência, sobretudo porque estamos diante de um filme de época, que nos faz crer que Roma está de volta.

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Também não há muitos filmes em que o corte do diretor realmente mude o significado da história e da narrativa. O portal do paraíso talvez seja o mais representativo, em razão da polêmica que cercou o corte imposto à metragem original da obra de Cimino. E há os cortes com os quais os diretores não concordam, como aquele de Duna, nunca aceito por David Lynch. Nos últimos anos, talvez não haja outro corte novo tão significativo quanto o de Cruzada, feito por Ridley Scott. A duração original tinha 144 minutos e a que saiu em Blu-ray tem 194 minutos, ou seja, quase uma hora de acréscimo. O filme com a metragem original tinha uma grande qualidade, no entanto era irregular; Scott, por meio dessas cenas novas, mostra realmente um épico. Talvez essa diferença não funcione com todos, talvez eu tenha visto a primeira versão em uma época em que esperava mais, e hoje esse gênero de filme parece mais raro; particularmente, a versão estendida de Cruzada é extraordinária, um dos melhores momentos na trajetória de Scott.
O filme inicia em 1184, mostrando um ferreiro, Balian (Orlando Bloom), na França, às voltas com a perda recente da esposa, que se suicidou depois de perder o bebê. Chega à sua cidade o Barão Godfrey de Belin (Liam Neeson), que pede a Balian para que o acompanhe em direção à Terra Santa. Godfrey lhe pede para que sirva ao Rei de Jerusalém, Rei Baldwin IV (Edward Norton, escondido atrás de uma máscara de ferro), assessorado por Tiberias (Jeremy Irons), o Marechal de Jerusalém. O rei é irmão da princesa Sibylla (Eva Green), que se interessa por Balian, enquanto seu marido Guy de Lusignan (Marton Csokas) investe contra os muçulmanos com a Ordem dos Templários. Abre-se uma guerra de Jerusalém contra Saladino (Ghassan Massoud).

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Dizer que Cruzada tem elementos de Gladiador, filme anterior de Ridley Scott, é bastante claro. Mas eis uma obra em que realmente a fotografia, de John Mathieson, faz uma diferença imprescindível, auxiliado pelo fabuloso desenho de produção. Se Orlando Bloom se entrega com certa dificuldade ao papel principal – e seus conflitos nunca são devidamente externados –, Scott selecionou um grande elenco coadjuvante, não apenas Norton, Irons e Massoud, mas Eva Green em um dos momentos de início de carreira mais exitosos. Sua personagem em Cruzada é possivelmente a mais elaborada do roteiro, adotando uma dualidade estranha, e, ao mesmo tempo que tenta ser sedutora, é abalada pela tragédia. É Green quem conduz com talento as cenas com Bloom. Trata-se de um personagem feminino típico da filmografia de Scott, que lançou a Ripley de Sigourney Weaver em 1979 e pouco mais de uma década depois fez Thelma & Louise. A personagem de Green se conecta com essas personagens na maneira de ver além de seu tempo, e Scott deseja visualizá-la com os encantos de Marion Cotillard de Um bom ano num cenário justificado de combate entre exércitos.

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Já Scott filma não apenas cenários do Oriente Médio com um talento impressionante, como faz uma batalha final (de em torno de 40 minutos) com a mesma persuasão de Kurosawa em Ran, como apontou certa crítica. Não estamos mais no meio da fantasia, mas de uma reprodução da história poucas vezes igualada na história do cinema. Se a atuação de Bloom não está à altura dessa grande condição alcançada pelo filme, não exatamente importa: a versão com mais de três horas concede a ele uma chance a mais, com sequências não quebradas de maneira abrupta como na versão que foi aos cinemas. Com este filme, também se conclui que os anos 2000 não ficam para trás dos anos 70-80 na qualidade da obra de Scott: Cruzada forma um número de fpeas muito interessantes, ao lado de Falcão negro em perigo, Os vigaristas e O gângster.

Kingdon of heaven, EUA, 2005 Diretor: Ridley Scott Elenco: Orlando Bloom, Eva Green, Jeremy Irons, David Thewli, Brendan Gleeson, Marton Csokas, Liam Neeson, Marton Csokas Roteiro: William Monahan Fotografia: John Mathieson Trilha Sonora: Harry Gregson-Williams Produção: Ridley Scott Duração: 144 min. (versão de cinema) 194 min. (versão estendida) Estúdio: Scott Free Productions,
Inside Track,Studio Babelsberg Motion Pictures GmbH Distribuidora: 20th Century Fox

 

 

O curioso caso de Benjamin Button (2008)

Por André Dick

Esta fábula dirigida por David Fincher pode parecer, à primeira vista, um Forrest Gump com menos humor, mas fica apenas na superfície a comparação. Em certos aspectos também parecido com Peixe grande, de Tim Burton, embora superior, o filme de Fincher tem um lado fabular não apenas pela figura de Benjamin Button, que nasce velho e vai rejuvenescendo. Isso seria o resultado de uma espécie de pedido feito por Monsieur Gateau (Elias Koteas), que está construindo o relógio da estação de trem de Nova Orleans e, tendo perdido seu filho na guerra, gostaria que o tempo contasse para trás (spoilers a partir daqui)..
Nascido no dia de encerramento da Primeira Guerra, em 1918, Button é abandonado pelo pai, Thomas Button (Jason Flemyng) na escadaria de um asilo e acolhido por uma afro-americana, Queenie (Taraji P. Henson), uma enfermeira, e seu namorado Tizzy (Mahershala Ali). Neste ambiente, em que a morte está presente todos os dias, e também trazendo todas as enfermidades no corpo de nenê, Button se refugia do restante do mundo. No entanto, já um pouco crescido (embora curvado e numa cadeira de rodas), é levado pela mãe adotiva a uma missa, sob as preces de um pastor começa a andar – lembrando também o filme com Tom Hanks – e, aos poucos, vai se acostumando a sair de casa, até que conhece Daisy (na infância, Ellen Fanning; na vida adulta Cate Blanchett), cuja avó mora no asilo.

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É esse amor que vai acompanhá-lo a vida toda, até que se reencontram quando têm a mesma idade, ou seja, no meio da vida. Tal drama – de o personagem nunca pertencer totalmente a seu tempo – é o que torna o filme de Fincher tão denso, assim como a maneira com que expõe o relato da mulher apaixonada por Benjamin.
Ao mesmo tempo, temos o relato de Daisy já envelhecida, acompanhada de Caroline (Julia Ormond), sua filha num hospital, que lê o diário de Benjamin, enquanto se aproxima a tempestade do Katrina. Suas lembranças não são apenas aquelas de que a mãe participa, mas principalmente as de Benjamin, que conta sobre o dia em que conhece Ngunda Oti (Rampai Mohadi), que, pelo tamanho, acha ser uma pessoa muito próxima e enfrenta seu primeiro afastamento de casa; sua amizade com o capitão Mike (Jared Harris), que lhe dá um emprego em seu rebocador, o leva para conhecer um bordel, em cuja saída acaba sendo abordado, sem saber, pelo pai; e o seu envolvimento com Elizabeth Abbott (Tilda Swinton, sempre com uma discrição elegante), mulher de um espião inglês, a qual conhece num hotel em que fica hospedado enquanto aguarda o momento de ir para alto-mar.

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Numa dessas idas e vindas, o rebocador de Mike é chamado para servir na Segunda Guerra, e Benjamin se oferece para integrar a tripulação. Todas essas lembranças são filmadas de maneira delicada por Fincher, utilizando de maneira irrepreensível os cenários, quase sempre vazios, mas acolhedores, como aquele em que Benjamin encontra sua amante (o filme recebeu o Oscar de direção de arte) no hotel. Entre idas e vindas para o asilo, Benjamin não consegue esquecer Daisy, sua paixão desde a infância, desde o momento em que conversa com ela debaixo de uma cabana na sala do asilo, iluminado pelas lanternas (como algum registro perdido de Wes Anderson), e ela se torna dançarina, participando de um grande grupo de balé, levando a uma das mais belas cenas – quando ele a contempla dançar depois de anos em frente a um espelho de estúdio.
O roteiro é de Eric Roth, o mesmo que realizou o de Forrest Gump, a partir de uma história de F. Scott Fitzgerald, talvez por isso haja elementos de ligação entre os dois filmes. O terreno é o da fantasia, pouco experimentado por Fincher, a não ser em Alien 3, com todo seu peso e opressão, expandido em policiais de serial killers de Zodíaco, Seven e Millennium e na claustrofobia de O quarto do pânico e Clube da luta. Mas em Benjamin Button o plano trágico do personagem – de ter sido abandonado e não recebido o amor da mãe, como acontece com Forrest – se destaca nas mãos de Fincher.

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Vemos seu personagem por dentro, ou seja, não é um simples arquétipo de fábula ou uma história universal, mas trágico,  o que é traduzido por uma das melhores interpretações até hoje de Brad Pitt. Nesse sentido, ainda mais interessante o romance atemporal de Benjamin pela amada e a noção de que a origem pode também representar o fim, ou vice-versa, e Cate Blanchett, com seu habitual distanciamento , convence. Todos esses sentimentos são reunidos com singularidade por Fincher, e a atmosfera do filme adquire um grau de melancolia que abrange tanto os afastamentos de Button da família e de Daisy (quase forçados) quanto aqueles em relação aos amigos que ele fará, mas certamente não irá manter, seja pela separação, seja pela perda. Há uma ambientação poucas vezes vista em outros filmes, em que o tempo ganha uma aceleração e uma permanência, uma aproximação e uma distância. Benjamin, ao contrário de Gump, não participa de grandes realizações, mas está permanentemente interessado em concretizar seu amor por Daisy e, quando participa de um acontecimento, como o da Segunda Guerra, é mais como coadjuvante.
Ainda assim, isso parece proposital em Fincher: ele está justamente mostrando um personagem singular, que não consegue se inserir nunca no tempo em que está. Também parece não ter interesse especial por isso: ele está mais interessado em reencontrar o espaço onde foi salvo, como se a ele tivesse de se apegar para a continuidade de sua existência. O espaço do asilo é sempre uma referência para a junção dos tempos que se perderam, assim como os comentários de um senhor sobre fatos de seu passado e os encontros tardios com seu pai.

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O que realmente é curioso no filme de Fincher é como esse quadro sentimental de vários personagens não tenta ser, em nenhum momento, piegas: sua emoção surge não dos personagens, mas da maneira como as imagens foram selecionadas. De inegável beleza toda a trajetória do casal pelos anos 60, pintando o apartamento e vivendo de forma descompromissada, acentuando a solidão de cada imagem; ou de Pitt, lembrando o Marlon Brando de O selvagem da motocicleta, andando numa estrada deserta e encoberta por nuvens escuras.
O filme ganha relevo por meio da bela fotografia de Claudio Miranda e da trilha sonora arrebatadora de Alexandre Desplat (lembrando alguns elementos daquela que Morricone fez para Cinzas no paraíso). Miranda filma Benjamin Button com os detalhes que conhecemos em outras obras de Fincher, e ele prossegue a linha de imagem entre o amarelo e o verde de O quarto do pânico, Zodíaco, e, depois de Benjamin Button, de Millennium e A rede social, sempre com as digitais de Fincher. Cada instante do filme de O curioso caso de Benjamin Button consegue arrebatar pela melancolia.

The curious case of Benjamin Button, EUA, 2008 Diretor: David Fincher Elenco: Brad Pitt, Cate Blanchett, Julia Ormond, Elias Koteas, Jason Flemyng, Taraji P. Henson, Mahershala Ali, Fiona Hale, Elle Fanning, Jared Harris, Tilda Swinton Roteiro: Eric Roth Fotografia: Claudio Miranda Trilha Sonora: Alexandre Desplat Produção: Ceán Chaffin, Kathleen Kennedy, Frank Marshall Duração: 166 min. Estúdio: Paramount Pictures / Warner Bros. Pictures / The Kennedy/ Marshall Company Distribuidora: Paramount Pictures (América do Norte) e Warner Bros. Pictures (Internacional)