Napoleão (2023)

Crítica sobre Napoleão, de Ridley Scott, com Joaquin Phoenix, no canal do YouTube. Se puder, deixe seu apoio se inscrevendo. Você vai encontrar lá críticas recentes sobre Asteroid city, Assassinos da lua das flores, Beau tem medo, Guardiões da galáxia – Vol. 3, Barbie, Oppenheimer, Besouro Azul, entre outros.

Também atualizo as críticas no Letterboxd Em breve mais críticas também escritas aqui.

Obrigado por sua atenção.

O assassino (2023)

Crítica sobre “O assassino”, de David Fincher, com Michael Fassbender, no canal do YouTube.

Indicados ao Oscar 2023

Por André Dick

Melhor filme

Nada de novo no front
Avatar – O caminho da água
Os Banshees de Inisherin 
Elvis
Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo
Os Fabelmans
Tár
Top Gun: Maverick
Triângulo da tristeza
Entre mulheres 

Alguns indicados na categoria principal do Oscar são muito estimados pela crítica em geral. Sabe-se dos grandes elogios a obras como Os Banshees de Inisherin, Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo e Os Fabelmans. Em segundo plano, ficam Tár, sobre uma música interpretada por Cate Blanchett, muito bem feito mesmo um pouco vazio de sentimento, e Avatar – O caminho da água, o meu preferido desta lista. Elvis é um ótimo filme, mas infelizmente rotulado como mera cinebiografia, quando realmente tem qualidades especiais. Triângulo da tristeza é outra obra provocativa, embora esta bastante falha, do sueco Ruben Östlund, que tem sido bastante recepcionado em Cannes, já com duas Palmas de Ouro na bagagem, inclusive por esse filme. O alemão Nada de novo no front é tecnicamente exuberante e funciona bem até a metade, depois o ritmo atenua, no entanto é, sem dúvida, um destaque. E Entre mulheres é o filme que se assemelha a Adoráveis mulheres, de Greta Gerwig. Dos selecionados, talvez a maior surpresa seja Top Gun: Maverick, uma sequência de um filme muito querido dos anos 80 e que consegue com ideias simples agradar tanto à grande plateia quanto à Academia. Alguns filmes mereciam ter sido considerados, como Babilônia e o mal avaliado Amsterdam, melhor do que a maior parte desses indicados. Do mesmo modo, Batman, de Matt Reeves, é uma adaptação incrível de HQs, e Armaggedon time talvez o melhor filme de James Gray. Também há outras belas obras, como Crimes do futuro, do habitualmente ignorado David Cronenberg, e Bardo, de Alejandro G. Iñárritu, receber apenas uma indicação ao Oscar de melhor fotografia mostra o distanciamento da Academia de um cinema mais complexo, o que é uma pena e sinal dos tempos. Blonde também é um filme excelente que a escalada avessa da crítica fez contaminar também o público, rotulando o projeto como excessivo, quando é uma visão crua e nos moldes de David Lynch da trajetória de uma estrela que querem ver como inspiração e sexy simbol – a obra a apresentou apenas com as angústias de um ser humano.

Melhor direção 

Daniel Kwan e Daniel Scheinert, por Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo
Martin McDonagh, por Os Banshees de Inisherin
Ruben Östlund, por Triângulo da tristeza
Steven Spielberg, por Os Fabelmans
Todd Field, por Tár

Aqui temos um diretor já com dois Oscars, Steven Spielberg, vencedor por A lista de Schindler e O resgate do soldado Ryan e Todd Field já teve Entre quatro paredes bem recepcionado em 2002. Os Daniels são bastante elogios por seu trabalho em Tudo em todo o lugar, enquanto Östlund é um diretor sueco bastante elogiado desde Força maior e The Square, este vencedor da Palma de Ouro em Cannes, como Triângulo da tristeza. Martin McDonagh não recebeu indicação ao Oscar por Três anúncios para um crime, filme bem melhor do que Os Banshees de Inisherin, no qual quis apostar mais num humor menos acessível em termos sentimentais. Há diretores que mereciam indicação, começando por James Cameron e seu trabalho fantástico em Avatar – O caminho da água; é o mesmo caso de Damien Chazelle por Babilônia. Vencedor do Oscar por La La Land, não conseguiu repetir o feito em O primeiro homem e neste novo filme. Vencedor por Birdman e O regresso, a direção de Alejandro G. Iñárritu em Bardo é excelente mais uma vez.

Melhor ator

Austin Butler, por Elvis
Colin Farrell, por Os Banshees de Inisherin
Brendan Fraser, por A baleia
Paul Mescal, por Aftersun
Bill Nighy, por Living

Austin Butler é um nome cotado desde a estreia de Elvis, por sua atuação extraordinária. Farrell teve um bom ano também fazendo o Pinguim de Batman, e sua atuação em Os Banshees de Inisherin é competente, mas não me parece para estatueta. Ainda não vi a atuação elogiada de Fraser por A baleia, nem a de Bill Nighy em Living. Não entendo a inclusão de Paul Mescal, talvez por Aftersun ter sido bem recebido pela crítica. O roteiro não o ajuda e não me parece atuação destacada. Uma pena Banks Repeta não ter sido considerado por Armageddon time. Uma bela atuação mirim. Diego Calva tem uma atuação singular em Babilônia, mesmo que seu personagem seja às vezes colocado em segundo plano pela miscelânea de acontecimentos. Adam Driver também está excelente, com timing de humor perfeito, em Ruído branco. O mesmo em relação a Viggo Mortensen, fora de série em Crimes do futuro. Gosto muito também de Adam Sandler em Arremessando alto e de Christian Bale em Amsterdam, além de Robert Pattinson, ignorado injustamente por Cosmópolis e O farol, ter ótima atuação em Batman. Ralph Fiennes apresenta atuação muito boa em O menu.

Melhor atriz

Cate Blanchett, por Tár
Ana de Armas, por Blonde
Andrea Riseborough, por To Leslie
Michelle Williams, por Os Fabelmans
Michelle Yeoh, por Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo

Cate Blanchett teve um crescimento muito significativo nas atuações depois que trabalhou com Terrence Malick em Cavaleiro de copas e De canção em canção. É a favorita por Tár, uma excelente atuação, contudo Ana de Armas entrega o melhor de sua trajetória em Blonde. Não consigo ver motivos para a indicação de Michelle Williams, uma atriz com atuações mecânicas, como a de Os Fabelmans, e Michelle Yeoh faz o possível com o fraco roteiro de Tudo em todo o lugar. Não vi Andrea Riseborough. Acho que podiam ter lembrado de Carey Mulligan e Zoe Kazan por Ela disse. Florence Pugh merece consideração por Não se preocupe, querida, embora digam que sua melhor atuação está em O milagre, com que não concordo. Jessie Buckley tem ótima atuação no terror Men.

Melhor ator coadjuvante 

Brendan Gleeson, por Os Banshees de Inisherin
Brian Tyree Henry, por Causeway
Judd Hirsch, por Os Fabelmans
Berry Keoghan, por Os Banshees de Inisherin
Ke Huy Quan, por Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo

Ke Huy Quan, de Os Goonies e Indiana Jones e o templo da perdição, é o favorito por Tudo em todo o lugar. Brendan Gleeson e Berry Keoghan têm boas atuações em Os Banshees de Inisherin, embora não a ponto de tornar o filme mais comunicável em seus sentimentos, e Judd Hirsch tem participação correta, mas nada de marcante, em Os Fabelmans. Eu teria lembrado de Chris Pine por sua atuação em Não se preocupe, querida. Outros esquecidos: Tom Hanks (Elvis) – indicado de maneira ridícula no Framboesa de Ouro –, Anthony Hopkins (Armageddon time), John Turturro (Batman), Edward Norton (Glass Onion), Mark Rylance (Até os ossos).

 Melhor atriz coadjuvante 

Angela Bassett, por Pantera Negra – Wakanda para sempre
Hong Chau, por A baleia
Kerry Condon, por Os Banshees de Inisherin
Jamie Lee Curtis, por Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo
Stephanie Hsu, por Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo

Adoro a atuação de Angela Bassett no novo Pantera Negra, fazendo um blockbuster ganhar densidade com sua participação. Não chego a achar as atuações de Jamie Lee Curtis e Stephanie Hsu destacadas em Tudo em todo o lugar, e ainda não vi Hong Chau. Kerry Condon tem atuação discreta em Os Banshees de Inisherin, nada que, a meu ver, representasse indicação. Por que não lembrar de Kristen Stewart e sua grande atuação em Crimes do futuro?

Melhor roteiro original

Martin McDonagh, por Os Banshees de Inisherin
Daniel Kwan e Daniel Scheinert, por Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo
Steven Spielberg e Tony Kushner, por Os Fabelmans
Todd Field, por Tár
Ruben Östlund, por Triângulo da tristeza

Não vejo grandes destaques nesses indicados a melhor roteiro original, mas talvez Todd Field seja aquele que elabore uma história mais interessante. O roteiro de Os Fabelmans é correto; o de Os Banshees de Inisherin tenta fazer o existencial soar pop, no que se perde, e os de Tudo em todo lugar e Triângulo da tristeza talvez representem uma época em que se privilegia mais a velocidade e o discurso do que a consistência em termos de vínculos entre personagens. O trabalho de Bardo é notável, assim como os de Armageddon time e Crimes do futuro. Aprecio também como contam a história do astro de Elvis.

Melhor roteiro adaptado

Edward Berger, Lesley Paterson e Ian Stokell, por Nada de novo no front
Rian Johnson, por Glass Onion: Um mistério Knives Out
Kazuo Ishiguro, por Living
Kazuo Kruger, Eric Warren Singer e Christopher McQuarrie, por Top Gun: Maverick
Sarah Polley, por Entre mulheres

 Surpreendente a indicação de Top Gun: Maverick pela simplicidade, embora competência, do roteiro. Gosto também dos roteiros de Nada de novo no front e Glass onion, com alguns problemas, mas funcionais. Os dois outros ainda não vi. Teria colocado entre as opções de indicação Blonde, Ruído branco, O homem do norte Não se preocupe, querida.

Melhor filme internacional 

 

Nada de novo no front (Alemanha)
Argentina, 1985 (Argentina)
Close (Bélgica)
EO (Polônia)
The quiet girl (Irlanda)

Não vi ainda EO e Close. Desses indicados aprecio Nada de novo no front e acho The quiet girl um dos mais superestimados do ano. Apreciei filmes como Bardo, falsa crônica de algumas verdades e Holy spider, uma espécie de David Fincher iraniano, incrível em sua crítica de costumes. O brasileiro Marte Um poderia ter sido considerado: é muito sensível. Alguns devem ter sentido falta do indiano RRR, que recebeu o prêmio no Critics Choice Awards, mas não é minha xícara de chá.

Melhor animação em longa-metragem 

Pinóquio de Guillermo Del Toro
Marcel the shell with shoes on
Gato de botas 2 – O último pedido
A fera do mar
Red – Crescer é uma fera

O favorito é o Pinóquio de Del Toro, mas não chego a ser grande admirador do projeto. Os demais têm boas qualidades, embora eu não tenha visto Marcel the shell with shoes on.

Melhor documentário em longa-metragem

All that breathes
All the beauty and the bloodshed
Fire of love
A house made of splinters
Navalny

Melhor documentário em curta-metragem

The elephant whisperers
Haulout
How do you measure a year?
The Martha Mitchell Effect
Stranger at the gate

Melhor animação em curta-metragem

The boy, the mole, the fox and the horse
The flying sailor
Ice Merchants
My year of dicks
Ishiguro, por Living
Ehren An Ostrich Told Me the World is Fake and I Think I Believe It

Melhor curta metragem em live-action

An Irish Goodbye
Ivalu
Le pupille
Night ride
The red suitcase

CATEGORIAS TÉCNICAS

Melhor fotografia 

James Friend, por Nada de novo no front
Darius Khondji, por Bardo, falsa crônica de algumas verdades
Mandy Walker, por Elvis
Roger Deakins, por Império da luz
Florian Hoffmeister, por Tár

Melhor trilha sonora 

Volker Bertelmann, por Nada de novo no front
Justin Hurwitz, por Babilônia
Carter Burwell, por Os Banshees de Inisherin
Son Lux, por Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo
John Williams, por Os Fabelmans

Melhor canção original 

Sofia Carson – “Applause” (de Tell it Like a Woman)
Lady Gaga – “Hold my hand” (de Top Gun: Maverick)
Rihanna – “Lift me Up” (de Pantera Negra – Wakanda para sempre)
“Naatu Naatu” (de RRR)
Son Lux – “This is a Life” (de Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo)

Melhor edição 

Mikkel E.G. Nielsen, por Os Banshees de Inisherin
Matt Villa e Jonathan Redmond, por Elvis
Paul Rogers, por Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo
Monika Willi, por Tár
Eddie Hamilton, por Top Gun: Maverick

Melhor design de produção 

Nada de novo no front
Avatar – O caminho da água
Babilônia
Elvis
Os Fabelmans

Melhor figurino

Mary Zophres, por Babilônia
Ruth E. Carter, por Pantera Negra – Wakanda para sempre
Catherine Martin, por Elvis
Shirley Kurata, por Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo
Jenny Beavan, por Sra. Harris vai a Paris

Melhor cabelo e maquiagem 

Nada de novo no front
Batman
Pantera Negra – Wakanda para sempre
Elvis
A baleia

Melhor som 

Nada de novo no front
Avatar – O caminho da água
Batman
Elvis
Top Gun: Maverick

Melhores efeitos visuais 

Nada de novo no front
Avatar – O caminho da água
Batman
Pantera Negra – Wakanda para sempre
Top Gun: Maverick

Na parte técnica, Avatar – O caminho da água, Top Gun: Maverick, Pantera Negra – Wakanda para sempre, Elvis, Os Fabelmans, Nada de novo no front e Babilônia se destacam. Mas Amsterdam ser ignorado, com seu design de produção criativo e figurino irretocável, além da fotografia de Emmanuel Lubezki, embora não a melhor do ano, pois ele não usa aqui toda a sua criatividade, com seu aspecto de filme atemporal, mostra que a Academia se baseou demais na recepção da crítica. Batman merecia mais consideração em melhor fotografia e trilha sonora, grandes componentes do filme de Reeves. Blonde é esquecido de maneira desigual, pois deveria ter sido lembrado em fotografia, design de produção, figurino e trilha sonora. E mesmo o novo Avatar não recebeu indicações a todos os prêmios técnicos que mereciam, pois é um triunfo visual nos moldes de O senhor dos anéis. Jurassic World – Domínio merecia pelo menos indicação pelos ótimos efeitos visuais. Não se preocupe, querida tem lindo design de produção e figurino, além de fotografia – completamente esquecidos. O homem do norte também completamente esquecido pela parte técnica irretocável, ao lado de Animais fantásticos – Os segredos de Dumbledore (o que afeta principalmente o prestígio de obras com elementos fantásticos). Ou seja, a Academia centraliza ainda indicações nos filmes vistos como principais e ignora em parte alguns que ficam mais à margem das discussões.

A festa do Oscar acontece em 12 de março.

Livro “Neste momento”, de André Dick

Por André Dick

Meu quarto livro de poesia, Neste momento, está em pré-venda no site da Kotter Editorial:

https://kotter.com.br/loja/neste-momento-andre-dick/

Até 8 de maio, está com 50% de desconto, por causa da IV Feira do Livro da Unesp.

O livro, com 140 páginas, traz também prefácio de Arnaldo Antunes (@arnaldo_antunes), orelha de Matias Mariani (@matiasmariani) e posfácio de Ronald Polito (@politoronald55).

“A naturalidade e delicadeza do discurso de André Dick, que flui à flor da pele em tom apaziguado, não deixam de revelar o inusitado a cada verso, ‘Como uma catarata / Do Niágara / No bebedouro'” (Arnaldo Antunes)

Neste momento opera por vezes como crônica poética de um annus horribilis, por vezes como olhar sobre uma pequena coleção de afetos, por vezes como um ensaio prático sobre animais e suas jaulas, mas opera sempre como a estrada, como o andarilho e como a viagem do fazer poético” (Matias Mariani)

“O texto de abertura, ‘Zoografia’, dá o tom do que ocorrerá em termos de procedimentos e enfoques não apenas formais em diversos poemas, como a atmosfera fabular e fantasiosa. Uma denominação assombrosa que uma criança formula para as coisas do mundo, tanto mais pela indistinção, onde tudo possui anima: lobo, árvore, guindaste, e também aquela que o enuncia, ao incluir nas descobertas a ‘batida de coração'” (Ronald Polito)

A todos que acompanham esta minha página de cinema, agradeço de antemão pelo interesse 🙂

Cinematographe

Pela primeira vez desde abril de 2012, quando foi ao ar, o Cinematographe vai entrar num período de descanso. Ele vai continuar no endereço do Twitter (acesso a ele nesta página), com atualizações sobre lançamentos, filmes clássicos e enquetes.

Obrigado por sua companhia e sua leitura.

Um grande abraço.

André Dick

2001 – Uma odisseia no espaço (1968)

Por André Dick

Este é um dos maiores clássicos da ficção científica com efeitos impressionantes para sua época (e ainda hoje) de Douglas Trumbull, um roteiro, baseado no conto “A sentinela”, de Arthur C. Clarke, que lançaria o livro homônimo quase simultaneamente ao lançamento do filme, e uma direção impecáveis. Kubrick está interessado em mostrar o isolamento do homem não apenas em sua aurora, mas no espaço sideral, assim como fez com o jovem Alex, que servia de cobaia para experimentos químicos em Laranja mecânica, e o Jack Torrance, de Nicholson, em O iluminado. E mostra que, por meio da experiência da solidão, o homem pode mudar e avançar contra o passado e contra o futuro, ao mesmo tempo.
2001 (spoilers a partir daqui) inicia com homens-macacos em algum lugar remoto do passado, descobrindo a defesa – atacados por leopardos ou ameaçados por outras tribos – e a violência – ao esfacelar o crânio de um animal – e entrando em contato com um monólito, perto de rochas onde eles dormem. Essas imagens revitalizam qualquer gênero, e o filme de Kubrick contradiz a ficção científica como um gênero apenas baseado no fantástico e não no histórico, mesmo como narrativa, ao mesmo tempo em que é um cinema praticamente sem diálogos, o que é apontado como um motivo de tédio, isso se 2001 não fosse também uma revitalização da forma de narrar.
Depois de lançado um osso ao espaço – numa transição antológica –, este se transforma em espaçonave, transportando o espectador para 2001, que carrega o Dr. Heywood Floyd  (William Sylvester), depois de uma conversa com Elena (Margaret Tyzack), cientista russa, e seu colega Dr. Smyslov (Leonard Rossiter), em direção à lua, em que foi desencavado um monólito negro misterioso, igual àquele que os homens-macacos cercavam.

Esta mudança de lugar e tempo é típica do talento de Kubrick, que move sempre a narrativa para espaços diferentes daqueles que naturalmente se esperava – aqui, vai até a Pré-História, numa reconstituição que impressiona a cada vez que assistimos, para, a partir daí, se deslocar rumo ao infinito e ao vazio do espaço inexplorado pela Discovery (em Nascido para matar, o espaço do Vietnã é também o da loucura e de um regresso às origens, assim como o Overlook, de O iluminado, é um traçado do labirinto da mente humana e De olhos bem fechados, uma saga noturna em busca da autossatisfação), em missão até Júpiter, através de novos sinais do monólito – e talvez de presença alienígena. Em nenhum momento, é suscitada uma presença divina, ou algum vínculo exatamente religioso, mas 2001 também traz – como A árvore da vida, de Malick, em que há sequências que lembram o filme de Kubrick – este aspecto de discussão. Também traz o embate não mais entre os homens-macacos e os animais, mas entre os homens e os computadores.
O computador da nave, o HAL 9000 (com voz marcante de Douglas Rain), em plena expansão da IBM – letras seguintes de HAL –, o único a realmente saber sobre a missão, começará a se rebelar contra os tripulantes, deixando os astronautas David Bowman (Keir Dullea) e Frank Poole (Gary Lockwood) perplexos. Ele acredita, pois, antes de tudo, tem uma concepção humana, que a missão deve ser abortada. É inevitável perceber que HAL tem traços mais humanos do que os tripulantes da Discovery, sobretudo David, que recebe um cumprimento de aniversário sem mostrar o menor ânimo ou sentimento, e, quando se aproxima de seu desligamento, acaba demonstrando o mesmo medo humano. Ao mesmo tempo, os astronautas parecem mais um experimento e correm e se alimentam sem tratarem de nenhum aspecto da missão.
Mas o mistério maior está no monólito negro, uma peça que se desloca entre tempos distintos (estava na Pré-História, cercado por macacos, e agora flutua pelo espaço). É ele que mostra a atemporalidade da vida, o que Kubrick quer constantemente ressaltar. Não sabemos se é o monólito aquele que confunde HAL 9000, ou o conduz à tentativa de encerrar a missão. Quando David se vê numa situação extremamente difícil, resta a ele continuar sua trajetória. E Kubrick continua, em cada frame, notável. O final é enigmático e, ao mesmo tempo, precursor de imagens relacionados ao futuro, mostrando os limites do espaço, em busca de Deus. O quarto nos moldes vitorianos em que o astronauta vai parar, com seu piso iluminado (uma espécie de ambiente precursor dos ambientes de Barry Lindon e do salão de festas de O iluminado, além do piso de Os embalos de sábado à noite, cuja discoteca se chama exatamente 2001), é, do mesmo modo, a contemplação da história e da juventude nos olhos de um ser que passou por todos os momentos de sua vida num piscar de segundos.

Kubrick realiza tudo com exatidão e detalhamento, pontuados pela direção de arte, tendo à frente Anthony Masters, que havia feito a de Lawrence da Arábia e faria a de Duna, e pela fotografia de Geoffrey Unsworth, que trabalhou na série Superman, Cabaret, entre outros filmes. É a junção entre direção de arte e fotografia – com a trilha sonora clássica de fundo, pontuando as cenas de transição da Pré-História para o futuro, como o “Danúbio azul” – que torna o filme um objeto tão brilhante, a ser examinado sempre, uma espécie de ficção científica baseada num conceito de inovação e ruptura.
Nada a ver, portanto, com sua sequência, 2010, que, mesmo com excelentes efeitos especiais de Richard Endlund (de Indiana Jones e Guerra nas estrelas) e uma direção de arte irretocável (de Syd Mead, de Blade Runner) e cuja narrativa trata de americanos, comandados pelo doutor Floyd (Roy Scheider), e russos numa missão – encontrar a nave Discovery, desaparecida no final do primeiro filme, que foi localizada pela última vez perto da lua de Saturno –, não apresenta novidades. É claro que os americanos comandam os soviéticos e há patriotismo na trama, mas a mensagem do filme, embora com ar de Guerra Fria, é interessante. Sua meta é explicar, o que não aconteceu em 2001, vagamente por que o computador HAL 9000 enlouqueceu no primeiro e parte do mistério do monólito negro.
Por sua vez, Kubrick deseja uma espécie de mistério inexplicável sobre a origem do universo e para onde somos conduzidos, seja pela mão de uma força superior, seja por nossas próprias forças. Sua visão sobre nossa origem e como a evolução traz detalhes semelhantes (os homens-macacos ao redor do monólito, assim como os astronautas na Lua) revela uma extrema sensibilidade, sobretudo porque apresenta uma síntese para nossos receios e desejos. Como diz Kubrick: “Tentei criar uma experiência visual, que contorne o entendimento para penetrar diretamente o inconsciente com seu conteúdo emocional” (em Claude Beylie, As obras-primas do cinema).

Por isso, ao mesmo tempo, o brilho do sol em Kubrick tenta revelar uma espécie de verdade. Se muitas tomadas de A árvore da vida embaixo das árvores – vendo sempre o ponto de vista da criança – procuram sempre um resquício de sol (que num determinado momento lembra exatamente o de 2001, na cena em que ele aparece vagarosamente na linha do horizonte), nem por isso ele se deixa carregar por um sentimento de ver a linguagem se esvair em imagens de apenas encantamento, em 2001 a luminosidade é uma tentativa de alinhar os planetas e as naves. Difícil entrar em contato com imagens tão profundamente enigmáticas como aquelas que cercam a aurora do homem – com seu horizonte alaranjado –, passando pela missão na Lua, em que a sombra, antes dos ossos animais no amanhecer, agora é das espaçonaves passando por elevações, até a sequência final, que conduz a um labirinto de cores fortes eclodindo nos olhos e a leveza da imagem do feto, do bebê, dentro da forma de um planeta, na qual Kubrick eleva a imagem a um símbolo, a uma metáfora, de tudo que havia sido observado antes. É exatamente o “conteúdo emocional” das imagens que conduz 2001 ao patamar de obra-prima.

2001 – A space odyssey, EUA/ING, 1968 Diretor: Stanley Kubrick Elenco: Keir Dullea, Gary Lockwood, William Sylvester, Dan Richter, Douglas Rain, Leonard Rossiter, Margaret Tyzack, Robert Beatty, Sean Sullivan, Frank Miller, Penny Brahms Produção: Stanley Kubrick  Roteiro: Stanley Kubrick e Arthur C. Clarke Fotografia: Geoffrey Unsworth Trilha Sonora: Alex North, Gyorgy Ligeti Duração: 139 min. Distribuidora: Não definida Estúdio: Metro-Goldwyn-Mayer (MGM) / Stanley Kubrick Productions

Cotação 5 estrelas

2001 – Uma odisseia no espaço (1968)

Por André Dick

2001 kubrick 3

Este é um dos maiores clássicos da ficção científica com efeitos impressionantes para sua época (e ainda hoje) de Douglas Trumbull, um roteiro, baseado no conto “A sentinela”, de Arthur C. Clarke, que lançaria o livro homônimo quase simultaneamente ao lançamento do filme, e uma direção impecáveis. Kubrick está interessado em mostrar o isolamento do homem não apenas em sua aurora, mas no espaço sideral, assim como fez com o jovem Alex, que servia de cobaia para experimentos químicos em Laranja mecânica, e o Jack Torrance, de Nicholson, em O iluminado. E mostra que, por meio da experiência da solidão, o homem pode mudar e avançar contra o passado e contra o futuro, ao mesmo tempo.
2001 (spoilers a partir daqui) inicia com homens-macacos em algum lugar remoto do passado, descobrindo a defesa – atacados por leopardos ou ameaçados por outras tribos – e a violência – ao esfacelar o crânio de um animal – e entrando em contato com um monólito, perto de rochas onde eles dormem. Essas imagens revitalizam qualquer gênero, e o filme de Kubrick contradiz a ficção científica como um gênero apenas baseado no fantástico e não no histórico, mesmo como narrativa, ao mesmo tempo em que é um cinema praticamente sem diálogos, o que é apontado como um motivo de tédio, isso se 2001 não fosse também uma revitalização da forma de narrar.
Depois de lançado um osso ao espaço – numa transição antológica –, este se transforma em espaçonave, transportando o espectador para 2001, que carrega o Dr. Heywood Floyd  (William Sylvester), depois de uma conversa com Elena (Margaret Tyzack), cientista russa, e seu colega Dr. Smyslov (Leonard Rossiter), em direção à lua, em que foi desencavado um monólito negro misterioso, igual àquele que os homens-macacos cercavam.

2001.Kubrick.Filme

2001 kubrick

2001.Kubrick.Aurora

Esta mudança de lugar e tempo é típica do talento de Kubrick, que move sempre a narrativa para espaços diferentes daqueles que naturalmente se esperava – aqui, vai até a Pré-História, numa reconstituição que impressiona a cada vez que assistimos, para, a partir daí, se deslocar rumo ao infinito e ao vazio do espaço inexplorado pela Discovery (em Nascido para matar, o espaço do Vietnã é também o da loucura e de um regresso às origens, assim como o Overlook, de O iluminado, é um traçado do labirinto da mente humana e De olhos bem fechados, uma saga noturna em busca da autossatisfação), em missão até Júpiter, através de novos sinais do monólito – e talvez de presença alienígena. Em nenhum momento, é suscitada uma presença divina, ou algum vínculo exatamente religioso, mas 2001 também traz – como A árvore da vida, de Malick, em que há sequências que lembram o filme de Kubrick – este aspecto de discussão. Também traz o embate não mais entre os homens-macacos e os animais, mas entre os homens e os computadores.
O computador da nave, o HAL 9000 (com voz marcante de Douglas Rain), em plena expansão da IBM – letras seguintes de HAL –, o único a realmente saber sobre a missão, começará a se rebelar contra os tripulantes, deixando os astronautas David Bowman (Keir Dullea) e Frank Poole (Gary Lockwood) perplexos. Ele acredita, pois, antes de tudo, tem uma concepção humana, que a missão deve ser abortada. É inevitável perceber que HAL tem traços mais humanos do que os tripulantes da Discovery, sobretudo David, que recebe um cumprimento de aniversário sem mostrar o menor ânimo ou sentimento, e, quando se aproxima de seu desligamento, acaba demonstrando o mesmo medo humano. Ao mesmo tempo, os astronautas parecem mais um experimento e correm e se alimentam sem tratarem de nenhum aspecto da missão.
Mas o mistério maior está no monólito negro, uma peça que se desloca entre tempos distintos (estava na Pré-História, cercado por macacos, e agora flutua pelo espaço). É ele que mostra a atemporalidade da vida, o que Kubrick quer constantemente ressaltar. Não sabemos se é o monólito aquele que confunde HAL 9000, ou o conduz à tentativa de encerrar a missão. Quando David se vê numa situação extremamente difícil, resta a ele continuar sua trajetória. E Kubrick continua, em cada frame, notável. O final é enigmático e, ao mesmo tempo, precursor de imagens relacionados ao futuro, mostrando os limites do espaço, em busca de Deus. O quarto nos moldes vitorianos em que o astronauta vai parar, com seu piso iluminado (uma espécie de ambiente precursor dos ambientes de Barry Lindon e do salão de festas de O iluminado, além do piso de Os embalos de sábado à noite, cuja discoteca se chama exatamente 2001), é, do mesmo modo, a contemplação da história e da juventude nos olhos de um ser que passou por todos os momentos de sua vida num piscar de segundos.

2001.Kubrick.Filme 2

2001.Kubrick.Nave

Kubrick realiza tudo com exatidão e detalhamento, pontuados pela direção de arte, tendo à frente Anthony Masters, que havia feito a de Lawrence da Arábia e faria a de Duna, e pela fotografia de Geoffrey Unsworth, que trabalhou na série Superman, Cabaret, entre outros filmes. É a junção entre direção de arte e fotografia – com a trilha sonora clássica de fundo, pontuando as cenas de transição da Pré-História para o futuro, como o “Danúbio azul” – que torna o filme um objeto tão brilhante, a ser examinado sempre, uma espécie de ficção científica baseada num conceito de inovação e ruptura.
Nada a ver, portanto, com sua sequência, 2010, que, mesmo com excelentes efeitos especiais de Richard Endlund (de Indiana Jones e Guerra nas estrelas) e uma direção de arte irretocável (de Syd Mead, de Blade Runner) e cuja narrativa trata de americanos, comandados pelo doutor Floyd (Roy Scheider), e russos numa missão – encontrar a nave Discovery, desaparecida no final do primeiro filme, que foi localizada pela última vez perto da lua de Saturno –, não apresenta novidades. É claro que os americanos comandam os soviéticos e há patriotismo na trama, mas a mensagem do filme, embora com ar de Guerra Fria, é interessante. Sua meta é explicar, o que não aconteceu em 2001, vagamente por que o computador HAL 9000 enlouqueceu no primeiro e parte do mistério do monólito negro.
Por sua vez, Kubrick deseja uma espécie de mistério inexplicável sobre a origem do universo e para onde somos conduzidos, seja pela mão de uma força superior, seja por nossas próprias forças. Sua visão sobre nossa origem e como a evolução traz detalhes semelhantes (os homens-macacos ao redor do monólito, assim como os astronautas na Lua) revela uma extrema sensibilidade, sobretudo porque apresenta uma síntese para nossos receios e desejos. Como diz Kubrick: “Tentei criar uma experiência visual, que contorne o entendimento para penetrar diretamente o inconsciente com seu conteúdo emocional” (em Claude Beylie, As obras-primas do cinema).

2001 kubrick 5

2001 kubrick 4

Por isso, ao mesmo tempo, o brilho do sol em Kubrick tenta revelar uma espécie de verdade. Se muitas tomadas de A árvore da vida embaixo das árvores – vendo sempre o ponto de vista da criança – procuram sempre um resquício de sol (que num determinado momento lembra exatamente o de 2001, na cena em que ele aparece vagarosamente na linha do horizonte), nem por isso ele se deixa carregar por um sentimento de ver a linguagem se esvair em imagens de apenas encantamento, em 2001 a luminosidade é uma tentativa de alinhar os planetas e as naves. Difícil entrar em contato com imagens tão profundamente enigmáticas como aquelas que cercam a aurora do homem – com seu horizonte alaranjado –, passando pela missão na Lua, em que a sombra, antes dos ossos animais no amanhecer, agora é das espaçonaves passando por elevações, até a sequência final, que conduz a um labirinto de cores fortes eclodindo nos olhos e a leveza da imagem do feto, do bebê, dentro da forma de um planeta, na qual Kubrick eleva a imagem a um símbolo, a uma metáfora, de tudo que havia sido observado antes. É exatamente o “conteúdo emocional” das imagens que conduz 2001 ao patamar de obra-prima.

2001 – A space odyssey, EUA/ING, 1968 Diretor: Stanley Kubrick Elenco: Keir Dullea, Gary Lockwood, William Sylvester, Dan Richter, Douglas Rain, Leonard Rossiter, Margaret Tyzack, Robert Beatty, Sean Sullivan, Frank Miller, Penny Brahms. Produção: Stanley Kubrick  Roteiro: Stanley Kubrick e Arthur C. Clarke Fotografia: Geoffrey Unsworth Trilha Sonora: Alex North, Gyorgy Ligeti Duração: 139 min. Distribuidora: Não definida Estúdio: Metro-Goldwyn-Mayer (MGM) / Stanley Kubrick Productions

Cotação 5 estrelas