Homem de ferro 3 (2013)

Por André Dick

Homem de ferro 3.Filme 4

Em 2008, Robert Downey Jr., como o Homem de Ferro, enfrentou um grande vilão, Obadiah Stane (Jeff Bridges). Em 2010, novamente sob a direção de Jon Favreau, ele regressou ao papel de herói, tendo como rivais dois vilões interessantes, Ivan Vanko (Mickey Rourke) e Justin Hammer (Sam Rockwell). Ainda assim, o que se destacava, ainda mais do que o primeiro, era o bom humor de Downey Jr., além da aparição de Samuel L. Jackson e da cena de boxe com a personagem de Scarlett Johansson.
Se este segundo filme subestimado já começava no tribunal, com o Homem de Ferro sendo pressionado a dividir os segredos de sua invenção com o Estado, aqui o herói, já estabelecido e fazendo novos experimentos com sua armadura, começa se lembrando de um episódio ocorrido em 1999 (daqui em diante, spoilers) quando dormiu com uma bióloga, Maya Hansen (Rebecca Hall), na virada do ano em Berna, depois de ser abordado por um homem estranho, Aldrich Killian (Guy Pearce), a fim de tratar de negócios.
Com coadjuvantes de luxo, Favreau se saiu bem nos dois filmes que dirigiu, aliando técnica nos efeitos visuais e uma montagem eficiente, enquanto neste terceiro Shane Black tem uma dificuldade especial de dosar o ritmo. Com essa questão episódica demais – o passado que retorna com todos os seus problemas –, ele parece não conseguir, como Favreau, inserir os personagens em conjunto, apesar de a primeira meia hora ser agradável, e afasta alguns deles da trama durante muito tempo. A relação entre o Homem de Ferro e Pepper Potts (Gwyneth Paltrow, eficiente como nos outros filmes) parece ter congelado no final do segundo filme. Ela está à frente, nas empresas, enquanto ele está em sua mansão, trabalhando no porão, escondido. Ele também não conversa pessoalmente uma vez sequer com aquele que, em determinado momento, de modo irônico, vai provocar nele um espírito de revanche (nem conversará no fim, o que parece indicar problemas no roteiro).

Homem de ferro 3

Homem de ferro 3.Filme 3

Desta vez, ele guarda pesadelos da batalha de Nova York de Os vingadores, mas o afastamento continua o mesmo, e não há exatamente um aprofundamento em sua psicologia, o que havia antes do clímax do segundo. Ou seja, se antes Stark e Pepper estavam quase sempre juntos, aqui parece que eles não têm vínculo estabelecido, apenas uma necessidade de dividir diversas piadas na sala de estar e no quarto. Nesse sentido, o filme não deixa a desejar.
A vida do Homem de Ferro começa a ser ameaçada quando surge um terrorista, Mandarim (Ben Kingsley, que parece saído diretamente do set de O ditador), que remete sobretudo a Bin Laden, e ele consegue invadir, com seus vídeos, todas as redes de televisão, depois de atentados em que não se consegue descobrir a origem das bombas. Embora aqui não estejamos tratando de A hora mais escura, e sua polêmica com as cenas de tortura, há cenas de humor um tanto estranhas (sobretudo aquelas que acontecem no Paquistão), pois trata-se de um filme de diversão que evoca diretamente um contexto muito mais sério. O aspecto cômico do filme acaba abalado por sua tentativa de estabelecer um contato com acontecimentos reais, que não são divertidos. Em algumas dessas sequências, entra em cena aquele que se denomina Patriota de Ferro, que na verdade é Jim Rhodes (Don Cheadle, menos efetivo do que no segundo filme).
Depois de uma catarse sonora e de efeitos especiais, é preciso, para Black, dar vazão ao filme e cultivar seus elementos externos, colocando o Homem de Ferro como amigo de um menino, Harley (Ty Simpkins, bom ator), o que, apesar de soar simpático e render momentos divertidos (sobretudo um diálogo que deve ter sido feito de forma improvisada por Downey Jr.), acaba extraindo boa parte do núcleo do filme e parece querer agradar, de forma apressada, o público infantil. O herói precisa recuperar-se para enfrentar o vilão: porém, o que ele faz é decorar uma garagem como laboratório. Claro que não se deseja achar que filmes que almejam o divertimento têm necessariamente uma faceta dramática, mas pode haver uma pausa para recuperar as ações. Quando acontece a catarse com sua mansão – e ela aparece no trailer –, tratando-se de uma sequência impressionante, com a ótima fotografia de John Toll (Cloud Atlas), onde ele, afinal, abrigava seus projetos, parece não haver a justa medida de sofrimento.

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Homem de ferro 3.Filme 2

Num filme de ação, é preciso temer os vilões e se torcer para o herói superar suas dificuldades. Quando o herói parece não sentir dificuldades nem tem desejo de reparar a realidade em que vivia, a tensão, em boa parte, se perde (evidente no fato de que muitas vezes ele não está diretamente envolvido na ação e na conversa final, depois dos créditos). E quando o vilão, Mandarim, revela sua verdadeira faceta, vemos um lado de Kingsley constrangido (o extraordinário ator não escapa ileso da brincadeira).
Black, que fez o roteiro de todos os filmes da série Máquina mortífera (os dois primeiros são especialmente bons), mas também dos fracos O último boy scout e O último grande herói, e antes fez apenas um filme, justamente com Downey Jr., Beijos e tiros, que brincava com o cinema noir e tinha um estilo interessante, demonstra mais competência do que o esperado para cenas de ação grandiosas (e há pelo menos três no filme que parecem superar qualquer outra da série), mas acaba destoando justamente onde se esperava mais: no roteiro bem delineado e com diálogos eficientes. O que se vê é uma sucessão de gags, de todos os estilos, algumas delas divertidas, sobretudo pela atuação de Downey Jr. E, vendo de forma distanciada, um diretor que fez apenas um filme e não dirigia há oito anos não seria a melhor alternativa para imprimir ritmo.
O Homem de Ferro de Downey Jr. não pode ser levado totalmente a sério, mas tampouco soa sem elementos dramáticos ou sem uma relação paterna que o acompanha na criação da própria empresa. Aqui, a porção dramática diminui consideravelmente em passagens com maior tendência à autossátira, quase como o que fez Richard Lester em Superman III, e a crise de ansiedade inventada para Stark parece aleatória. Existe, inclusive, uma sequência que lembra a do personagem de Tom Cruise em Encontro explosivo, satirizando ele próprio em Missão impossível. Pelos trailers, parecia, inclusive, que haveria uma espécie de influência do terceiro Batman pela escuridão das imagens. Não é o que acontece (nem deveria), mas trailers certamente ajudam a estabelecer uma concepção visual prévia para o que irá se assistir. Não se espere, portanto, nenhum traço sombrio. Mas, particularmente, o que tira a energia que deveria haver no duelo entre Homem de Ferro e o empresário Killian é justamente Guy Pearce, ator que tem dificuldade de estebelecer uma ligação com a plateia e parece soar em muitos momentos exagerado. Sua atuação é, particularmente, equivocada, ainda mais por causa do roteiro e quando comparada às de Jeff Bridges, no primeiro, e de Rourke e Rockwell no segundo.
Existe emoção em Homem de ferro 3 quando Downey Jr. consegue mesclar o elemento do bom humor com o drama, quando ele está numa situação delicada e percebe que Pepper pode correr um perigo indesejado. É justamente quando estabelece ligações humanas que Homem de ferro 3 cresce. Quando ele soa com elementos de sátira a outros filmes, inclusive aos da série, ele acaba por não conseguir fazer o que mais quer: divertir.

Iron man 3, EUA, 2013 Diretor: Shane Black Elenco: Robert Downey Jr., Gwyneth Paltrow, Guy Pearce, Ben Kingsley, Paul Bettany, Rebecca Hall, Jon Favreau, Don Cheadle, James Badge Dale, Ashley Hamilton, Yvonne Zima, William Sadler, Ty Simpkins, Miguel Ferrer Produção: Kevin Feige Roteiro: Shane Black, Drew Pearce Fotografia: John Toll Trilha Sonora: Brian Tyler Duração: 130 min. Distribuidora: Disney Estúdio: DMG Entertainment / Marvel Studios / Paramount Pictures

Cotação 2 estrelas e meia