Warcraft – O primeiro encontro de dois mundos (2016)

Por André Dick

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Baseado em jogos eletrônicos da Blizzard Entertainment, Warcraft – O primeiro encontro de dois mundos pode ser visto como uma peça destinada apenas aos fãs específicos. Não sendo um conhecedor da série de jogos, World of Warcraft, criada em 1994, no entanto, cheguei ao filme principalmente por ser de uma vertente que admiro – a fantasia – e pela direção de Duncan Jones, realizador de uma obra muito interessante de ficção científica, com orçamento modesto, intitulada Lunar, além do thriller de ficção Contra o tempo. Duncan é filho de David Bowie, mas, enquanto o pai músico também apareceu à frente das câmeras, em diversos filmes interessantes, ele vem se tornando um dos nomes procurados para o desenvolvimento de projetos diferenciados. O natural é que Warcraft, a princípio, afaste quem não conhece nem admire especialmente sua origem nos jogos.
O espectador é colocado no meio de uma trama em alta velocidade. Uma horda de orcs guerreiros está para deixar seu planeta, Draenor, que está em ruínas, por um grande portal, guiada por Gul’dan (Daniel Wu), diretamente para Azeroth. Ali moram humanos, e a preocupação passa a ser com uma iminente batalha. Lothar (Travis Fimmel) busca a ajuda de um jovem mago, Hadgar (Ben Schnetzer), e ambos vão a Mago Medivh (Ben Foster), o atual Guardião de Tirisfal, com uma biblioteca secular, Karzhan. Enquanto isso, o Rei Llane Wrynn (Dominic Cooper), que tem como assessora Lady Taria (Ruth Negga), a rainha-consorte de Stormwind, espera por mais informações para que possa decidir o que fazer.

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Do lado dos orcs, acompanhamos a ação principalmente de Durotan (Tobby Kebbell), líder de uma das tribos de orcs, casado com Draka (Anna Galvin), que acabou de ter um filho, e que possui como principal amigo Orgrim Doomhammer (Robert Kazinsky) Ele é contrário ao posicionamento do grande líder, que parece sempre trazer destruição à sua volta, e encontra o mesmo posicionamento de Garona Meiorken (Paula Patton), uma mistura entre orc e humana. Se a quantidade de nomes incomoda, um conselho seria simplesmente embarcar na fantasia que o filme de Duncan Jones carrega, com um roteiro escrito por ele em parceria com Charles Leavitt, responsável pela narrativa de K-Pax e No coração do mar, baseados nas criações de Chris Metzen.
Se visto com superficialidade, Warcraft pode ser reduzido a apenas uma diluição de O senhor dos anéis – sobretudo quando aqui também há anões e águias voando para salvar os humanos –, porém, em termos de estética, ele propicia não apenas a aceitação de que realmente Peter Jackson deu uma contribuição preciosa ao mundo da fantasia, como abriu a possibilidade de se adaptar histórias até então não presenciadas na tela do cinema. Em termos de design de produção, assinado por Gavin Bocquet (da segunda trilogia Star Wars e Jack e o caçador de gigantes, que guarda semelhanças com o visual de Warcraft), por exemplo, o filme de Jones lembra vários outros do gênero, mas em nenhum momento deixamos de ver a atenção aos detalhes com que foi construído. Em igual escala, os figurinos de Mayes C. Rubeo (Avatar, John Carter) são verdadeiramente bem trabalhados e reais, com uma imponência que falta a outras peças do gênero, além de os efeitos visuais serem muito bem inseridos, de sobremaneira nas cenas em que o movimento dos orcs é captado, com uma verossimilhança destacável: é possível ver onde foram colocados os mais de 150 milhões de orçamento.

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Por mesclar muitos universos e referências, pode-se lembrar de Willow – Na terra da magia e Krull, ambos dos anos 80. De Krull, Jones apanha principalmente a primeira meia hora, quando o grupo do rei Llane anda por uma floresta e, finalmente, quando se misturam armas de fogo a duelos de espada entre homens e orcs (no filme de Yates, eram armas laser). De Willow, mais diretamente, uma referência bíblica em determinado momento. Também possui diálogos com Mestres do universo, a adaptação do desenho de He-Man feito pela Cannon. E um par ou outro de cenas remete ao melhor das adaptações nostálgicas de Conan com Schwarzenegger: eis um filme em que o diretor tem influências claras e consegue mesclá-las de maneira agradável e que tenha um conjunto capaz de ressoar junto ao espectador.
Warcraft está preocupado demais em criar uma atmosfera de fantasia para que o espectador perceba o quanto faltam alguns pontos para estabelecer melhor a trama, principalmente dentro da família real. No entanto, Jones se mostra muito competente em cobrir essas lacunas com cenas verdadeiramente impressionantes de ação, com uma violência um pouco acentuada em alguns momentos e ainda assim eficazes. Ele também funciona com o requisito do humor, principalmente com o Mago Medivh e o aprendiz Hadgar – numa relação que pode lembrar aquela de O nome da rosa, principalmente na importância simbólica da biblioteca e (spoiler a seguir) no fato de que um deles pode estar sendo envenenado, transformando-se em outro ser –, enquanto Lothar tem uma boa presença, por causa do seu intérprete Travis Fimmel, que lembra Paul Rudd. O vilão é realmente assustador, alimentando-se da energia de seres humanos para que possa ter ainda mais vigor – e a sua figura lembra a dos monstros de A vila, de M. Night Shyamalan.

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Jones também sabe fazer analogias entre o grupo de humanos e o grupo de orcs, por meio das figuras de Lothar e Durotan. Ambos querem manter a paz em seus povos, mesmo que esta paz represente justamente ter de se inserir numa batalha. Durotan, principalmente, está preocupado com seu filho e a continuação de seu clã. Não é diferente com Lothar, em relação a seu filho Callan (Burkely Duffield). A cena de nascimento do filho de Durotan e Draka é especialmente bem feita, como se ele fosse parte de dois mundos. Como O senhor dos anéis e outras fantasias, esta adaptação dos video games aposta no embaralhamento de linhagens e a manutenção ou não de um poder que possa trazer paz a todos. Em nenhum momento o filme nega as suas origens e isso contribui para que, mesmo quando não soe original, seja realmente autêntico. É bastante claro que Duncan Jones tem um respeito pela história e faz suas apostas com um grande elenco praticamente desconhecido. Como outro grande filme injustiçado, John Carter, também situado entre dois mundos, Warcraft vem ganhando quase a demissão sumária de grande parte da crítica, com gracejos, piadas, difamações e linhas escritas como frases de efeito inúteis. Mais uma vez, ela está errada: a obra de Duncan Jones é realmente interessante e, se vai ou não virar franquia, depende da sua recepção nas bilheterias. Torço, desde já, por uma continuação.

Warcraft, EUA, 2016 Diretor: Duncan Jones Elenco: Travis Fimmel, Paula Patton, Ben Foster, Dominic Cooper, Toby Kebbell, Ben Schnetzer, Robert Kazinsky, Clancy Brown, Daniel Wu, Ruth Negga Roteiro: Charles Leavitt, Duncan Jones Fotografia: Simon Duggan Trilha Sonora: Ramin Djawadi Produção: Alex Gartner, Charles Roven, Jon Jashni, Thomas Tull Duração: 123 min. Distribuidora: Universal Pictures Brasil Estúdio: Universal Pictures

Cotação 4 estrelas

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4 Comentários

  1. fredmorsan

     /  12 de junho de 2016

    Interessante que agora que li sua crítica posso responder à minha esposa o que ela me perguntou quando cheguei em casa: como foi o filme?

    Nesse dia eu não tinha ideia da história que tinha acabado de assistir. Era difícil pra mim explicar a trama para ela. Apesar de ter gostado da criação desse novo mundo (pra mim pelo menos), especialmente dos orcs, muitas coisas são colocadas na tela sem muita explicação e acaba nos tirando um pouco do filme, principalmente no lado humano.

    Não sei se foi proposital, mas me parece que os orcs são mais humanos e os humanos mais unidimensionais. Talvez tenha sido essa a intenção ou talvez o diretor, fã declarado do jogo, gostasse mais de jogar com os orcs. O ator que faz Lothar consegue se sair bem nas cenas de ação, mas nas cenas dramáticas (especialmente duas que envolve o próprio filho) ele consegue ser muito menos expressivo do que os orcs digitais.

    Enfim, saí do cinema com uma sensação de que fui apresentado a um mundo com grandes possibilidades mas que nenhuma delas havia já sido me mostrado.

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    • André Dick

       /  12 de junho de 2016

      Prezado Fred,

      agradeço por seu comentário. Eu assisti ao filme sem esperar um envolvimento com a história e com os personagens, mas o diretor Duncan Jones conseguiu fazer com que sua história não se resumisse aos efeitos visuais e cenários impressionantes. Acho, como você, que os seres humanos não foram elaborados como poderiam, mas, particularmente, O senhor dos anéis estabeleceu um parâmetro muito alto. O desenvolvimento de caracteres é decente perto de filmes de fantasia anteriores aos de Jackson. E o elenco, apesar de desconhecido, era agradável e não teve a má atuação que muitos enxergam. Gostei do ator principal e acho que ele se sente mais despretensioso do que heróis desse gênero. Como você também comenta, acho que o diretor conseguiu humanizar a figura dos Orcs, especialmente do casal principal. Sobre cenas sem explicação, senti o mesmo em alguns momentos, no entanto percebo que Jones privilegiou o ritmo contínuo (e os 40 minutos que foram excluídos devem trazer mais diálogos) e tornar as duas horas menores do que aparentam. Não acho, por exemplo, que o filme é complicado, mas Duna, de David Lynch, não era também e ofereciam um panfleto explicativo às pessoas antes de entrarem no cinema. Em termos do que ele se propõe, acho que Jones teve êxito. Para mim, foi uma surpresa.

      Volte sempre!

      Um abraço
      André

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  2. Balthar

     /  18 de junho de 2016

    Décimo primeiro na bilheteria.

    http://www.boxofficemojo.com/yearly/chart/?view2=worldwide&yr=2016&p=.htm

    Torço também por uma continuação.

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    • André Dick

       /  18 de junho de 2016

      Balthar,

      agradeço pela informação. E isso tudo com uma bilheteria pífia nos Estados Unidos, assim como Círculo de fogo.

      Um abraço,
      André

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