Viva – A vida é uma festa (2017)

Por André Dick

Nos últimos anos, a Pixar tem se destacado junto à Disney com obras como Divertida mente, mesmo sem os atrativos da época de Wall-E e UP, quando a companhia, ainda independente, fazia um trabalho considerado superior à maioria das animações. Particularmente, Universidade Monstros é o trabalho mais interessante da companhia, mas nunca foi devidamente aceito; no início de 2016, O bom dinossauro já havia sido severamente subestimado e Carros 3, no ano passado, fracassou injustamente nas bilheterias. No entanto, ao final do ano, surgiu um novo desenho animado, desta vez assumindo o posto de grande bilheteria: Viva – A vida é uma festa. Trata-se de um projeto pensado com visível afeto pela cultura que apresenta, dando atenção a detalhes temáticos e históricos.

A história se passa em Santa Cecilia, no México. Miguel Rivera (Anthony Gonzalez), de 12 anos, filho de Enrique (Jaime Camil) e Luisa (Sofía Espinosa), é o tataraneto de Amelia Rivera (Alanna Ubach), que foi casada com um músico que abandonou sua família. Ele abandonou Amelia e sua filha Ines (Ana Ofelia Murguía), bisavó de Miguel. Desde então, Amelia proibiu a música em sua família, agora dedicada ao trabalho de sapataria. O menino, no entanto, sonha em se transformar conhecido como Ernesto de la Cruz (Benjamin Pratt), cantor e ator consagrado dos tempos de Amelia. Quando é descoberto com um violão construído por ele próprio, a avó de Miguel, Elena (Renée Victor), fica muito irritada.
Depois de uma descoberta familiar, ele sai em busca de um violão para o show de talentos do Dia dos Mortos. Passando para o além, ele e seu cão Dante (uma homenagem à Divina Comédia) terão de passar por uma série de aventuras conhecendo figuras em forma de esqueleto, já mortas. Miguel conhece Hector (Gael García Bernal), que foi amigo de Ernesto. Ele está para ser esquecido pelo mundo dos vivos, pois ninguém mais homenageia sua imagem no Dia dos Mortos. Para isso, ele carrega um pedaço de fotografia. E o menino, para não ser amaldiçoado, não podendo mais voltar ao mundo dos vivos, por tentar roubar o vilão, precisa correr contra o tempo e solucionar questões que correspondem à história da família, tudo ao som de uma agradável trilha sonora de Michael Giacchino.

Dirigido por Lee Unkrich, o mesmo de Toy Story 3, com a codireção Adrian Molina, Viva – A vida é uma festa se situa entre o mundo dos vivos e o dos mortos, mas o faz de uma maneira nada previsível, não procurando colocar o espectador em meio a lições de moral apenas emotivas. Ele possui um núcleo, que é justamente a figura de Miguel. Querendo ser reconhecido como músico, em nenhum momento ele se comporta como alguém que deseja passar por cima dos outros a fim de atingir seus objetivos, e sim uma figura generosa. A maneira como Unkrich o desenvolve é o sinal de êxito do filme. Seu visual, além disso, é de um primor poucas vezes visto em animações, mesmo as de mais qualidade: há uma sensação de profundidade nas cenas, assim como os personagens não soam como caricaturas. Interessante como é mostrado o mundo dos mortos, com um colorido multifacetado e mesmo futurista, remetendo a algumas sequências de Tomorrowland. Um certo ar de estranheza percorre o mundo dos mortos, parecendo dialogar com algumas obras de Tim Burton, sem nunca perder o seu objetivo. E há figuras como Frida Kahlo (Natalia Cordova-Buckley) que aparecem no mundo dos mortos e acrescentam à movimentação dos personagens coadjuvantes de maneira bem-humorada. Há uma inserção do espectador neste universo apresentado.

Toda a jornada de Miguel é governada por um caráter de crescimento interno, reproduzido principalmente na maneira como ele passa a enxergar as figuras que antes idolatrava. O dilema dele – de precisar voltar à vida para não permanecer no universo dos mortos – tem elementos daquele de Marty McFly no primeiro De volta para o futuro – e mesmo seu braço se transformando em esqueleto ou a fotografia de Héctor remetem ao filme de Zemeckis. Havia bons momentos sobre o reconhecimento da terceira idade em Carros 3 e em Viva isso se repete de maneira comovente, por meio das figuras referenciais da família de Miguel. Os diretores Unkrich e Molina conseguem transparecer um sentimento que poucos filmes atingem, a exemplo de Nebraska, de Alexander Payne, ao tratar do isolamento de um familiar já um tanto distanciado dos demais devido ao tempo de vida. O roteiro de Adrian Molina e Matthew Aldrich é de grande sensibilidade nesse sentido, distribuindo para os personagens um espaço notável e sintetizando tudo com a canção “Remember Me”, numa obra que homenageia a cultura mexicana e a torna universalmente bela.

Coco, EUA, 2017 Diretor: Lee Unkrich Elenco: Anthony Gonzalez, Gael García Bernal, Benjamin Bratt, Alanna Ubach, Renee Victor, Jaime Camil, Alfonso Arau, Herbert Siguenza, Gabriel Iglesias, Lombardo Boya, Ana Ofelia Murguía, Natalia Cordova-Buckley, Selene Luna, Edward James Olmos, Sofía Espinosa Roteiro: Adrian Molina e Matthew Aldrich Fotografia: Matt Aspbury e Danielle Feinberg Trilha Sonora: Michael Giacchino Produção: Darla K. Anderson Duração: 109 min. Estúdio: Walt Disney Pictures, Pixar Animation Studios Distribuidora: Walt Disney Studios